As principais causas de amputação, bem como órgãos que mais são acometidos desse mal, além dos cuidados na fase de reabilitação são os temas enfocados nesse texto.
As causas mais comuns de amputação dos membros inferiores e superiores são de ordem vascular, por tumores e traumas decorrentes de acidentes em diversas situações. Segundo o médico gaúcho tramautologista Luiz Zanete Anicet, quando acontece esse evento, "o que se busca primeiro é tratar a causa que exige aquele procedimento cirúrgico para salvar a vida do paciente". No contexto, o mais importante é a pessoa e não o membro amputado, e nessa linha torna-se imprescindível uma abordagem global do paciente, de forma a assegurar o máximo de suas potencialidades físicas e psicológicas.
De qualquer forma, deve fica claro que os procedimentos para amputação de membros inferiores ou superiores é um ato de restauração de um órgão enfermo e não uma mutilação. Nessa conjuntura, é fundamental um trabalho integrado dos diversos tipos de profissionais envolvidos na reabilitação do paciente para estimular e valorizar a capacidade residual da pessoa atingida e assim buscar uma recuperação total.
No diagnóstico médico a amputação é considerada como um diagnóstico secundário, pois a enfermidade ou trauma recebe o rótulo de diagnóstico primário. E, posteriormente, se surgirem complicações, quanto mais cedo forem identificadas as causas, mais rápido poderá ser o controle e cura; o que possibilitará um melhor desempenho do paciente na fase da reabilitação.
Causas de Amputações
Entre as causas mais comuns de amputação de órgãos inferiores e superiores encontramos: vasculopatias periféricas, traumáticas, tumorais, infecciosas, congênitas e iatrogênicas. Destaca-se dentre elas, a vasculopatia periférica, que acomete em maior número pessoas na faixa etária de mais de 50 anos; sendo os membros inferiores (dedos, pés e pernas) os mais comprometidos. A causa mais comum nas amputações provocadas por eventos vasculares é a diabetes e o tabagismo. O Dr. Anicet salienta que a amputação de parte ou totalidade do membro se dá após o tratamento da doença original.
Já as causas traumáticas atingem também um número expressivo da população por acidentes de trânsito, de trabalho ou, em número menor, em razão de outra etiologia. Dentre os citados, os acidentes de trabalho tendem a culminar em amputações dos membros superiores (dedos, mão e braço).
Os tumores ósseos malignos como osteossarcoma também são responsáveis por amputação, especialmente de partes dos membros inferiores. Segundo o fisiatra Cezar Cavalcanti, nessa primeira fase o que deve ser tratado é o tumor para preservar a saúde do paciente e, posteriormente, através de uma equipe multidisciplinar dar todo o andamento necessário para que o paciente volte a ter uma vida normal nessa nova condição em que se encontra.
Principais Complicações nas Amputações
Entre as principais causas de complicações no coto estão deiscência de suturas, edemas, dor fantasma, ulceração do coto, inflamações, infecções, retração da cicatriz, neuromas e espículas ósseas. Esses tipos de problemas costumam afetar o coto da segunda a terceira semana após o ato cirúrgico. Os problemas decorrentes de causas como neuromas, contraturas musculares e hipotrofias, entre outras, acontecem mais tardiamente; muito embora a dor possa aparecer em qualquer época, apresentando características das mais diversas.
Um aspecto comum nos portadores de amputação é o chamado fenômeno "fantásmico", doloroso ou não, normal e ou deformado, que estará presente em 95% dos pacientes. Aproximadamente até a terceira semana após a cirurgia a maioria manifesta a percepção fantásmica de um membro normal e indolor. No entanto, alguns já se referem ao membro como deformado a partir da primeira semana. Para aqueles pacientes do primeiro grupo citado, passada as duas ou três semanas da cirurgia, o membro amputado dá a impressão de estar contorcido e desproporcional e não deveria apresentar dor.
A percepção, por parte do paciente, de um membro fantasma doloroso pode manifestar-se em membro fantasma normal ou deformado. Essa dor pode ser de leve a moderada, tolerável, respondendo de forma satisfatória à terapêutica física ou medicamentosa. Sua duração pode ocorrer durante semanas ou anos.
A dor fantasma (percepção de sensações, geralmente dolorosas em partes do membro que foram retiradas na cirurgia) é sempre grave e intensa, às vezes resiste a diversas formas de tratamento e consegue até impedir o programa de reabilitação. O surgimento pode se dar precoce ou tardiamente à amputação com duração imprevisível.
Já a dor no coto tem localização específica, apresentando características de desprazer leve, moderado ou intenso em conseqüência de diversos tipos de complicações.
"Independente da causa", comenta Cavalcanti, "todo o esforço deve ser feito para abolir a dor e a complicação deve ser corrigida, ou eliminada para que o processo de reabilitação do amputado se dê normalmente".
Outras complicações, especialmente nos membros inferiores, são os neuromas de amputação ou terminações de nervos no coto que formam um pequeno tumor neural que dá dor ou sensação de choque ao toque.
Reabilitação do Paciente
O tratamento global e integrado do paciente determinará o êxito de todo o trabalho reabilitacional programado. O objetivo final é capacitar o paciente ao maior aproveitamento de suas potencialidades de forma que ele possa ser independente nas atividades diárias da vida. Para isso, inclui-se o tratamento do coto (sem dor), com boa força muscular, sem edema e, portanto, apto para receber o soquete protético. Para o bom planejamento, o tratamento fisiátrico deve conter aspectos farmacológicos, físicos na fase pré, durante e após a colocação da prótese, psicossocial e profissional; fundamentais para o desempenho satisfatório do programa.
A avaliação fisiátrica compreende a reabilitação e a protetização. Sendo a reabilitação um procedimento terapêutico global que transcende os aspectos físicos, enquanto a protetização é a utilização de recursos técnicos especiais que visam a substituição parcial de um membro. Portanto, a reabilitação pode ser considerada mais completa se for seguida da colocação de uma prótese.
São mais comuns as próteses em pacientes com membros inferiores amputados, explica Anete. Inicialmente o paciente utiliza uma prótese chamada de pilão, com gesso, que é para adequar o coto à utilização desse recurso, tornando-o mais fino, rígido e indolor para que possa ocorrer um bom ajuste da prótese com o corpo. Além disso, o paciente deve fazer um tratamento com um fisioterapeuta para reeducação da marcha (uma nova forma de andar) e apreender a usar a prótese ao caminhar. Nessa fase, é fundamental a participação do amputado por que se ele não aderir ao programa, não conseguirá caminhar.
O Dr. Luiz Anicet conta um caso de uma paciente amputada em decorrência de um tumor que passou por todas as primeiras fases do processo de tratamento sem dificuldades perceptíveis, mas ao colocar a prótese que possibilitava a articulação do joelho para dobrar a perna decidiu, depois de um tempo de uso, fazer alterações no equipamento. Ela não quis o joelho flexível e optou por uma prótese de forma que a perna ficasse dura. "Segundo o médico é possível que a paciente não tenha sido adequadamente preparada física ou psicologicamente e sentiu-se melhor com uma prótese tipo pilão".
Por isso, torna-se fundamental a integração da equipe multidisciplinar no tratamento dos pacientes amputados para identificar, em tempo, qualquer sinal que possa comprometer o resultado do processo de reabilitação.
DORES APÓS AMPUTAÇÃO
Dor Fantasma
A Dor Fantasma é definida como aquela referente a retirada cirúrgica de um membro ou parte dele, porém esse termo não tem um conceito clínico muito bem definido. Ela compreende um indefinido e incomparável fenômeno sensorial. Dor no coto da amputação e dor no membro antes da amputação (dor pré-amputação) são distintas de dor fantasma propriamente dita. Outros fenômenos sensoriais como parestesias e feridas não podem ser incluídas no termo “dor fantasma”.
A delimitação clínica da dor fantasma é dificultada por diferenças no limiar da dor e na sua tolerância de um amputado para outro, soma-se a isso ainda o modo como as sensações dolorosas são relembradas e descritas.
Técnicas Não Invasivas
Estimulação elétrica transcutânea de nervos (TENS), acupuntura, relaxamento, ultra-som e hipnose podem, algumas vezes, ter efeitos benéficos no tratamento da dor fantasma. Terapias envolvendo massagens, manipulação e movimentos passivos podem prevenir mudanças tróficas e problemas vasculares no coto. Indução de influxo sensorial na área do coto também pode ter efeito benéfico.
TENS aplicadas no coto ou na extremidade contralateral têm sido usadas com algum sucesso no tratamento da dor fantasma. Esse tipo de tratamento é vantajoso por causa da falta de complicações e efeitos colaterais. Além disso, ela pode ser repetida várias vezes facilmente.
Nenhum tratamento com fármacos é especificamente eficaz no tratamento de dores crônicas em amputados. Entretanto, há estudos que demonstram os efeitos benéficos do uso da calcitonina intravenosa na dor do membro fantasma.
Nos casos de dores pré-amputação que persistem como dor fantasma, um tratamento eficaz da dor pré-operatória pode ser continuado com sucesso depois da amputação.
A dor do membro fantasma pode também ser resistente a qualquer tipo de tratamento.
Em alguns casos a carbamazepina tem um bom efeito e pode aliviar a dor quando o fármaco estabilizador de membranas é administrado em doses comuns. Alguns antidepressivos podem também ter efeito benéfico em alguns pacientes, especialmente paraplégicos e tetraplégicos com fratura da coluna vertebral. Os antidepressivos em doses menores do que as que correspondem a seu efeito antidepressivo quando usadas no tratamento da dor. Em alguns casos o antidepressivo doxepin e beta-bloquadores foram eficazes.
A dor permanente do membro fantasma não deve ser aceita antes da tentativa de tratamento com opióides, que podem ser usados com segurança durante anos mas com o risco da dependência.
A dor fantasma não pode ser tratada como uma manifestação psicológica nem como um distúrbio psiquiátrico. Porém, por motivos óbvios, os amputados algumas vezes são depressivos, emocionalmente instáveis e inseguros, o que acarreta a necessidade de um acompanhamento psicológico e psiquiátrico.
Técnicas Invasivas
Cirurgias de remoção dos neuromas (um fenômeno universal onde há formação de pequenos nódulos de fibras nervosas regeneradas e emaranhadas) que se formam no coto foram usadas em tratamentos mais antigos. Entretanto essa cirurgia não conseguia aliviar a dor pois, geralmente, a retirada dos neuromas provocava a formação de novos neuromas tão dolorosos quanto os primeiros.
Amputações proximais às anteriores com retiradas de maiores partes do coto também foram importantes no tratamento da dor fantasma e do coto. Essas cirurgias, atualmente, são usadas somente em amputados com problemas evidentes no coto. Encravar os neuromas no coto ou protegê-los são métodos que podem eliminar os sintomas de mecanossensibilidade aumentada.
A neurectomia (c) e a rizotomia (a), métodos que desligavam o coto das raízes espinhais dos nervos, eram usadas antigamente no tratamento das dores dos amputados. Mas, devido aos resultados insatisfatórios (elas, muitas vezes, substituíam a dor original por um sofrimento mais grave) elas são, hoje, técnicas quase completamente abandonadas.
A simpatectomia (b) foi um método cirúrgico adotado devido à participação do sistema nervoso simpático nas dores fantasma e do coto. Porém, ela tem um efeito limitado e geralmente não controla a dor. O papel da simpatectomia na dor fantasma depois da guanitidina ainda não está esclarecido.
Lesões na entrada da raiz dorsal, usadas como tratamento da dor em caso de avulsão do plexo braquial, são também usadas no tratamento da dor fantasma. Mas, seu efeito é limitado.
Estimulações na medula espinhal têm sido largamente usadas no tratamento da dor fantasma. Reunindo estudos de 9 autores, houve a seguinte constatação: em 148 pacientes, esse tipo de tratamento obteve 50 a 100% de alívio da dor em 51% dos pacientes e 25 a 50% de alívio em 18% dos pacientes.
Tratamentos com uma combinação de estímulos no cérebro e estimulação transcutânea obtiveram a redução da dor em mais de 50%.
A cordotomia (d) foi um método muito usado no tratamento da dor fantasma. Estudos de 5 pequenos pesquisadores mostraram que 38% dos pacientes obtiveram alívio de 50% a 100% e 44% dos pacientes obtiveram alívio de 25 a 50% com o uso desse método. Entretanto esse alívio não é prolongado e, por fim, pode haver aumento do desconforto e da dor. Esse tratamento é raro atualmente.
Prevenção
Nenhum tratamento, invasivo ou não, se mostrou eficaz na tentativa de cura da dor do membro fantasma. Em estudos realizados houve a constatação de que membros doloridos antes da amputação tinham maior probabilidade de desenvolver dor fantasma.
Esta observação fez com que pesquisadores investigassem os benefícios de um bloqueio antes da amputação. Eles descobriram que um bloqueio epidural lombar pré-operatório com bupivacaína ou morfina por 3 dias antes da operação reduzia a incidência de dor fantasma no primeiro ano após a amputação, mas não no segundo.
Essas descobertas podem ter papel importante nos tratamentos pré-operatórios futuros. Mas estudos ainda devem ser feitos nesse sentido.
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