TERAPIA OU TRATAMENTO?

VM&C: OS PACIENTES TÊM CONSCIÊNCIA DO SEU PROBLEMA?

SCHULTZ: Para muitas pessoas que vêm ao meu consultório, o TDAH é simplesmente uma doença que pode ser tratada com medicamentos. Alguma coisa não está funcionando direito no cérebro das crianças, foi o que lhes disseram. Isso considerando que as causas neuropsicológicas ainda não estão bem esclarecidas do ponto de vista científico. Há um grande conhecimento de detalhes, mas não existe até hoje um conceito biológico conclusivo sobre as causas do TDAH.

DÖPFNER: Eu tenho de discordar. Nós já sabemos muito hoje. Os critérios para o diagnóstico de TDAH estão claramente estabelecidos e já conseguimos definir com precisão também as subcategorias, como o transtorno de atenção isolado, sem hiperatividade. Todos os estudos dizem que os genes representam o maior fator individual para a causa do TDAH. Os cientistas só não chegaram ainda a um acordo sobre se os genes representam 50% ou 80%.

SCHULTZ: Mas os resultados genéticos se restringem quase somente à hiperatividade. Sobre o déficit de atenção ou a impulsividade das crianças nós não temos tanto conhecimento. Apenas há pouco tempo um estudo do psiquiatra Mark Stein, da Universidade de Chicago, mostrou que um determinado remédio reduz a extrema necessidade de movimentação dos pacientes, mas não produz efeito sobre o déficit de atenção isoladamente. Nesses casos, uma grande distinção é ainda necessária, ao prescrever medicamentos.

VM&C: VAMOS SUPOR QUE O TDAH TIVESSE SIDO DIAGNOSTICADO SEM NENHUMA DÚVIDA E METILFENIDATO, PRESCRITO. DURANTE QUANTO TEMPO A CRIANÇA TERIA DE TOMAR O MEDICAMENTO?

DÖPFNER: A desvantagem dos estimulantes é que eles só combatem os sintomas. Não operam nenhuma mudança nas causas orgânicas no cérebro e, portanto, só surtem efeito durante algumas horas. Por isso o tratamento se estende por vários anos. Muitas vezes é possível interromper a medicação na puberdade, mas pelo menos 20% dos afetados pelo transtorno continuam prejudicados na idade adulta.

SCHULTZ: Eu procuro, com meus pacientes, fugir dos medicamentos sempre que possível. Esse tipo de tratamento nada oferece para a vida da criança; ela não aprende coisa alguma sobre si mesma nem sobre como lidar melhor com seus problemas. Nos piores casos, ela fica com a impressão de que, de certa forma, é defeituosa e precisa constantemente de psicofármacos como muleta. Por esse motivo, na minha opinião, a psicoterapia deveria ser sempre o centro do tratamento.

 VM&C: QUEM NORMALMENTE TOMA A INICIATIVA DE LEVAR A CRIANÇA AO CONSULTÓRIO?


SCHULTZ: Cada vez mais os professores me mandam alunos que se destacam negativamente em sala de aula. Mas o professor pode achar que um aluno é insuportável, enquanto outro o considera apenas muito vivo e agitado, que precisa apenas de alguns limites. Certa vez um professor disse para uma criança, diante de toda a classe: "Você está doente e precisa tomar remédio!", sem levar em consideração o possível efeito negativo de suas palavras. Do meu ponto de vista, esta é uma tendência alarmante.

DÖPFNER: Em casos limites, uma boa pedagogia escolar é capaz de substituir de fato o uso de medicamentos ou pelo menos reduzi-lo ao mínimo. Por outro lado, estimulantes podem, até certo ponto, compensar uma aula ruim. De acordo com nossa experiência, quanto menos o professor coopera, tanto maior a necessidade de medicamentos. Em média, em cada classe há uma ou duas crianças com sintomas de TDAH, e elas sofrem consideravelmente com isso. Se muito mais crianças de uma classe tomam metilfenidato, provavelmente alguma coisa pode dar errado.

SCHULTZ: Agora você utilizou de modo correto o termo "sofrer". Segundo minha experiência, crianças com TDAH são consideradas mais perturbadoras do que sofredoras. Nós precisamos fugir com urgência dessa visão.

VM&C: E O QUE ACONTECE SE A PESSOA NÃO RECEBER TRATAMENTO ALGUM?


DÖPFNER: Às vezes os sintomas desaparecem sozinhos. A hiperatividade melhora sensivelmente por si só na pu-berdade, já os outros sintomas, nem tanto. Mas há também uma quantidade significativa de pessoas afetadas que se tornam marginais e criminosos na adolescência! Na Universidade de Colônia nós estamos realizando um estudo no sistema carcerário de adolescentes. A metade dos detentos dessas prisões é ou foi hipercinética. Adolescentes e jovens adultos com TDAH também estão quatro vezes mais envolvidos em acidentes de trânsito.

VM&C: O QUE ACONTECE NA TERAPIA COMPORTAMENTAL?

DÖPFNER: Ela tenta melhorar a interação entre a criança e os pais ou professores, que aprendem a construir uma relação mais positiva com a criança, estipular regras mais adequadas para ela e estar atentas ao seu cumprimento, assim como ajudá-la a lidar com situações difíceis, como fazer lição de casa. Quanto maior a criança, mais ativa pode ser sua participação no processo. Os adolescentes passam a ser o centro da terapia e, em seu projeto de autocontrole, aprendem a estipular metas importantes possíveis de ser alcançadas. Também é estimulada sua capacidade de concentração.

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