segunda-feira, 2 de julho de 2012

A IMPORTÂNCIA DO PSICÓLOGO NO TRATAMENTO DE CRIANÇAS HOSPITALIZADAS


RESUMO 

O presente artigo tem por objetivo apresentar a importância do psicólogo no trabalho com crianças no ambiente hospitalar sob a visão de  funcionários do hospital e acompanhantes. 


Para desenvolver tal trabalho partiu-se da análise de dados coletados através de questionários aplicados com a equipe de  funcionários do hospital e acompanhantes presentes no mesmo. 

Foram realizadas, também, observações no espaço de recreação, com o intuito de conhecer as interações entre pacientes e funcionários; e 
verificar onde e como o profissional de psicologia  poderia inserir-se nesse contexto. 

Constatou-se que, tanto acompanhantes como funcionários afirmaram a importância e a necessidade do psicólogo no hospital.

INTRODUÇÃO 

No final do século XIX e início do século XX surgiu no mundo à preocupação em como deveria se desenvolver o tratamento de crianças hospitalizadas. Nesse contexto, aparece o psicólogo buscando a humanização do paciente, a compreensão dos aspectos emocionais e no que se refere ao tratamento de crianças, promovendo o seu desenvolvimento sadio e pleno. Este último requer a garantia de condições adequadas, possibilitando oportunidades de brincar e aprender. 

Matilde Neder
A Psicologia Hospitalar no Brasil tem início com Matilde Neder, desenvolvendo uma atividade na então Clínica Ortopédica e Traumatológica da USP, hoje Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. 

Foi convidada para acompanhar psicologicamente os pacientes submetidos à cirurgia de coluna. O trabalho consistia em preparar esses pacientes para a intervenção cirúrgica bem como para a recuperação pós-cirúrgica. Em 1957, Matilde se transfere para a atual divisão de Reabilitação do Hospital das Clínicas, antigo Instituto Nacional de Reabilitação da USP. 

Matilde em sua conferência, realizada em 1957, se pronuncia sobre várias temáticas da Psicologia, entre elas traça aquilo que seria o perfil do psicólogo. Segundo ela o psicólogo deve investir na sua formação profissional, ter uma assistência psicológica, a fim de se conhecer melhor e aprender a trabalhar com os demais membros da equipe em que estiver inserido. 

O trabalho de Matilde Neder teve grande repercussão na Psicologia Hospitalar do Brasil, por ser a pioneira nessa área, e na história da Psicologia Brasileira, pois em 1959 discorreu sobre temas ainda hoje discutidos na Psicologia.  

Bellkiss Wilma Romano Lamosa é convidada em 1974 para a organização e implantação do Serviço de Psicologia no Instituto do Coração - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Ela recebeu esse convite após anos de atividades em diferentes unidades desse hospital. Bellkiss, em 1983, recebe a responsabilidade geral do I Encontro Nacional de Psicólogos da Área Hospital, promovido pelo Serviço de Psicologia do Hospital das Clínicas da USP. 

Em Abril de 1988 Lamosa defende sua tese de doutorado “O Psicólogo Clínico em Hospitais no Brasil. Uma Contribuição para o Desenvolvimento da Profissão”, sendo a primeira tese a abordar a realidade da psicologia hospitalar no Brasil. 

Bellkiss Lamosa destaca-se na história da psicologia hospitalar no Brasil pela suas obras, como Psicologia Aplicada à Cardiologia, e pelo seu empenho em mostrar a importância, definição e a atuação do psicólogo no ambiente hospitalar.  

Heloísa Chiattone 
Na história da psicologia brasileira figuram muitos nomes, como: Wilma C. Torres, Regina D’Aguino, Marli Rosani Meleti, Maria Sá Leitão, Valdemar Augusto Angerami, Heloísa Benevides Carvalho Chiattone, entre outros  grandes nomes. Heloísa Chiattone destaca-se atuando no Serviço de Pediatria no Hospital Brigadeiro – SP, implantando o Setor de Psicologia. Foi pioneira, normatizando o Projeto Mãe-Participante, no qual as mães tem mais participação na hospitalização, podendo acompanhar o filho pré e pós cirurgia, ficando internada no mesmo hospital junto com o seu filho. 

Segundo Perrin e Gerrity (1984), cerca de 5 a 10% de todas as crianças apresentam, em alguma época da infância, uma enfermidade prolongada ou incapacidade moderada grave. 

Quando a enfermidade remete a uma hospitalização, existe a possibilidade de causar vários efeitos psicológicos negativos, entre eles destacam-se: depressão, ansiedade, negação da doença, regressão, auto-estima negativa, solidão, reações de culpa e sensação de punição, distúrbios neuróticos, interrupção ou atraso escolar, etc. Esses efeitos e reações dependem da subjetividade de cada um, de sua situação sócio-familiar, econômica e do tipo da enfermidade. 

A Psicologia Hospitalar, respeitando as limitações provindas da doença, tenta suprir as necessidades, não só orgânicas, mas também as que se referem ao psicológico e educacional da criança. O psicólogo trabalha para manter o equilíbrio, muitas vezes perdido durante o período de internação. Esse desequilíbrio ocorrido na criança durante a hospitalização esta diretamente ligada à retirada do convívio familiar, a privação das brincadeiras e da vida escolar, sendo obrigada a se envolver em tratamentos e relacionamentos com pessoas estranhas em situações imprevisíveis, onde se encontram bastante fragilizadas. 

Uma das dificuldades das equipes de saúde encontra-se no modo de tratar a criança enferma, pois de maneira geral eles tendem a considerar apenas o estado físico e orgânico do paciente. O despreparo dessa equipe em considerar os aspectos mentais e sociais acaba por afetar um possível quadro de desequilíbrio psicológico, advindo da hospitalização. 

preocupação em considerar os aspectos mentais e sociais do paciente é de fundamental relevância, principalmente quando se refere ao tratamento de crianças, já que essas se encontram vulneráveis fisicamente e psicologicamente perante a doença, as restrições e a necessidade de cuidados constantes de pessoas estranhas, como o enfermeiro e o médico.  

O objetivo da equipe de saúde é “minimizar o sofrimento da criança hospitalizada”, levando em consideração as limitações advindas da enfermidade. Muitos são os efeitos psicológicos resultantes da hospitalização, já apresentados anteriormente, outro fator que pode desencadear alterações psicológicas é a separação da criança enferma de sua mãe. 

privação materna, ou de uma pessoa que desempenhe esse papel, vai interferir na saúde mental da criança. Foi observado que crianças que não tem essa relação apresentam retardo físico, social, intelectual e desenvolveram uma personalidade instável. 

Esses efeitos provocados na infância pela ausência materna durante uma internação hospitalar foram descritas por Aubry (1955), demonstrando as seqüelas da privação materna que segundo ele variam de acordo com: 

* a idade da criança; 
*situação psicoafetiva da criança e seu relacionamento prévio com a mãe;    
*personalidade e capacidade de adaptação da criança; 
*atitudes da equipe hospitalar; 
*rotinas vigentes no hospitalar; 
*experiências mais ou menos satisfatórias vividas durante a hospitalização; 
*duração da internação. 

A forma como se reage na infância à hospitalização deve ser observada pela equipe de saúde. As crianças normalmente reagem negativamente à hospitalização, chorando, demonstrando medo desespero e ansiedade.  


Quando a  criança é considerada “bom paciente”, que não causa preocupação, fáceis de lidar e obedientes, deve-se tomar cuidados extras, pois ela pode estar desequilibrada psicologicamente e por isso aceita a situação sem questionar ou reclamar de nada. 

Por outro lado crianças emocionalmente carentes, que são agredidas e/ou passam fome, elas mostram-se gratificadas, pois através da enfermidade conseguem atenção e obtêm cuidados que supram suas  necessidades psicológicas e fisiológicas.   
  
Durante a internação as crianças sofrem uma série de transformações psicológicas. Elas chegam ao hospital com uma visão de si e do mundo,  a qual é modificada a partir das experiências vividas nesse contexto. 

Na maioria das vezes essas crianças passam por um processo de despersonalização, elas são obrigadas a cumprirem a rotina hospitalar, que as padroniza, vestindo-as iguais, estipulando rigorosos horários de visitas, banho, alimentação, etc. 

Além de desenvolver uma insegurança em relação ao ambiente, se a criança apresentar ou sofrer alguma desfiguração física esse quadro tende a se agravar, pois ela também pode desenvolver uma insegurança em relação à família, ao tratamento e à equipe hospitalar. 

METODOLOGIA 

Levantamento qualitativo de dados foi realizado no do Hospital Infantil Dr. Mirócles Veras. Os dados foram coletados no mês de Novembro  entre os dias 3 e 14, partindo do agendamento prévio da direção do referido hospital.

Primeiramente, observou-se a rotina dos pacientes e dos funcionários do hospital. O trabalho teve como foco a ala da pediatria, mais precisamente na brinquedoteca; onde era freqüentada por crianças, geralmente sob os cuidados de um acompanhante, e/ou por voluntários, os quais buscavam interagir e ajudar os pacientes em qualquer necessidade.  

Num segundo momento, aplicaram-se questionários junto aos acompanhantes (pais, tios, etc.) e funcionários (médicos, enfermeiros, técnicos e voluntários) com intuito de se conhecer o perfil dos mesmos e seu ponto de vista a respeito da importância do psicólogo no trabalho com crianças em meio hospitalar. 

O questionário era composto por perguntas diretas e subjetivas, que visava conhecer a profissão, tempo de trabalho na instituição, etc. (para funcionários) ou grau de parentesco com o hospitalizado, mudança de comportamento da criança durante a hospitalização, etc. (para acompanhantes); e para ambos, perguntas sobre a importância do trabalho do psicólogo naquela instituição. Os dados coletados foram analisados pelos integrantes dos grupos e as divergências foram discutidas e revisadas, a fim de se obter maior clareza nas informações.  


DISCUSSÃO 

Uma rotina hospitalar rígida que determina horários previamente estipulados sem considerar as necessidades individuais de cada criança termina por fragilizar mais o seu psicológico. Diversos problemas psicológicos são gerados pela falta de explicação a criança sobre o que está ocorrendo, o porquê dos medicamentos aplicados e dos exames realizados, para Kovacs (1994) “o escamoteamento da verdade provoca um sentimento de estar sendo enganado ou sendo considerado ingênuo o que pode levar a um sentimento de profunda solidão”. 


Esses problemas poderiam ser facilmente amenizados se existisse a preocupação, que na maioria dos casos não existe, em tentar explicar a criança o que está acontecendo. 

Essa preocupação deve partir dos pais, que são as pessoas mais significativas para criança, os pais devem primeiramente controlar os seus sentimentos diante a doença do filho e depois buscarem um modo de preparar a criança para a hospitalização.  

A preparação da criança para a hospitalização é muito importante, pois ela deve conhecer as causas da sua internação o que pode vir a favorecer a reação da mesma mediante essa situação. Os pais devem preparar-se, também, levando em consideração a faixa etária e o nível de entendimento da criança, eles não devem  tentar mascarar a situação, alguns aspectos ou detalhes da hospitalização julgados irrelevantes para o conhecimento infantil, devem ser omitidos. Os pais não devem mentir, por que isso pode desenvolver uma desconfiança da criança em relação a eles. Os pais devem recorrer a um profissional para auxiliar nessa preparação, e o psicólogo seria um exemplo de profissional a ajudá-los. 

O processo de hospitalização deve ser entendido em sua totalidade, pois compreende um leque de variáveis a serem consideradas durante  o acompanhamento psicológico. A hospitalização não corresponde apenas a um período de restrições e cuidados extras, para o paciente significa um conjunto de fatores e implicações que afetam sua vida. Tratando-se de crianças, elas demonstram uma grande necessidade de acompanhamento psicológico e em muitos casos também exigem um acompanhamento após a internação, se o comprometimento tiver desestruturado emocionalmente a criança.       

A técnica de enfermagem C.A. J que trabalha a 24 anos na instituição na qual foi realizada a pesquisa afirma que as doenças de rotina são: diarréia, asma, pneumonia, queimaduras dos mais variados graus e refluxo. Sendo que tais doenças podem ser evitadas com um maior cuidado por parte dos pais ou responsável. Segundo a mesma, a ala infantil é diferenciada visto que os profissionais atuantes nessa ala estão trabalhando “por amor e por aptidão”, já que, segundo ela, para se trabalhar com crianças precisa ter uma sensibilidade e uma paciência aguda. 

Outra informação adquirida através da entrevista foi a da baixa 
freqüência de óbitos, sendo que existem quando o paciente já chega em situações de risco, e muitas vezes de fora do Estado do Piauí. Uma observação feita pela funcionária foi em relação à dificuldade da aceitação da morte, enfatizando que todos se sensibilizam.  

Perestrello, (apud Camom, 2003, p. 175), que diz:


A questão está em poder amar. Todo 
trabalho que o psicólogo pode 
desenvolver num hospital, junto ao 
paciente, equipe e família depende 
também da boa estruturação pessoal 
desse profissional. Ele, talvez mais do 
que os outros membros da equipe de 
saúde, é o depositário de um enorme 
gama de sentimentos pesados, como 
desespero, angústia, medo, as 
ansiedades, as frustrações, a impotência, 
etc. Tendo que administrar e conviver 
com eles em seu cotidiano de trabalho, 
o que nos leva a chamar atenção para a 
importância preocupação de não nos 
descuidarmos daquele que cuida, pois 
somente com estrutura pessoal bem 
resolvida, com espaço pessoal para 
também refletirmos sobre nossas 
dificuldade e angústias é que poderemos 
realizar um trabalho digno e adequado. 


Observa-se que os horários alternados de funcionamento da brinquedoteca causam certa ansiedade nas crianças hospitalizadas, pois as mesmas não sabem quando a brinquedoteca irá funcionar, o que pode provocar uma reação negativa, como choro, inquietação ou rejeição ao tratamento médico. 

Acreditasse que o funcionamento integral poderia auxiliar de uma melhor forma no tratamento e na maneira como as crianças reagem a essa situação, pois a brinquedoteca serve para que a criança não fique ociosa prejudicando sua recuperação.  


CONCLUSÃO 

De acordo com o exposto, conclui-se que o psicólogo é parte fundamental na equipe de saúde, que trabalhando junto a essa equipe e respeitando os limites institucionais de sua atuação consegue atingir seus objetivos. Podendo auxiliar os acompanhantes e a equipe de saúde no tratamento da melhor forma da criança hospitalizada, respeitando suas limitações e necessidades.  

Com isso o psicólogo faz-se necessário para se tentar compreender as transformações psicológicas ocorridas durante o período de internação, tentando intervir da melhor forma para que as possíveis seqüelas desse período sejam  amenizadas, não interferindo no desenvolvimento infantil. A minimização deve considerar todas as variáveis envolvidas no processo do adoecer para que o atendimento psicológico tenha êxito.     
Analisando os dados notou-se que todas as pessoas entrevistadas, mesmo que algumas não conhecessem o trabalho do psicólogo reconheceram a necessidade de um, para melhorar a abordagem da equipe com os acompanhantes e vice-versa e em um melhor tratamento da criança. 

Diante dessa realidade reafirmamos a necessidade de um trabalho psicológico com todos que estão inseridos na hospitalização infantil. A psicologia hospitalar tem a possibilidade de atuar nesse contexto auxiliando os profissionais e acompanhantes a tratar da maneira mais adequada possível essas crianças, tentando suprir as necessidades não só orgânicas, mas também as que se referem ao psicológico e educacional da criança, aspectos estes muitas vezes não considerados pelos demais profissionais que lidam com esses pacientes.  


REFERÊNCIA  

ANGERAMI, V. A. O Doente, a Psicologia e o Hospital. São Paulo: Pioneira 
Thomson Learning, 1992. 
ANGERAMI, V. A. (org.).  A Psicologia no Hospital. 2ed., São Paulo: Pioneira 
Thomsom Learning, 1988. 
ANGERAMI, V. A. Tendências em Psicologia Hospitalar. São Paulo: Pioneira 
Thomsom Learning, 2004. 
Escudeiro, A. (org.). Tanatologia : Conceitos - relatos – reflexões. Fortaleza: LC 
gráfica e editora, 2008. 
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-294X2005000200014&script=sci_arttext
acessado em 03/11/2008 ás 10:46 
www.scielo.br/pdf/paideia/v17n37/a02v17n37.pdf  acessado em 03/11/2008 ás 
11:02 
http://www.scielo.org.co/scielo.php?pid=S1657-          
92672005000100007&script=sci_arttext acessado em 03/11/2008 ás 11: 20 








Nenhum comentário:

Postar um comentário