sábado, 28 de julho de 2012

INTERVENSÕES PSICOLÓGICAS REALIZADAS NA CLÍNICA ONCO-HEMATOLÓGICA: DISCUSSÃO ACERCA DAS POSSIBILIDADES CLÍNICAS APRESENTADAS NA LITERATURA.


RESUMO
Este artigo, desenvolvido a partir da experiência no Serviço de Hematologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, foi feito em forma de pesquisa bibliográfica e buscou, refletir sobre trabalhos de intervenções psicológicas dentro da onco-hematologia e oncologia. 


Acredita-se que este levantamento pode oferecer maior propriedade sobre o assunto e sobre os alcances e limitações destas práticas, buscando uma reflexão sobre o que é possível ser realizado, dentro da demanda destes pacientes; entendendo que desta maneira estaremos contribuindo para melhores intervenções, projetos e questionamentos dentro do campo da onco-hematologia.

INTRODUÇÃO
Diante da experiência como psicóloga aprimoranda do Setor de Hematologia do HCFMUSP, a autora participou diretamente da realidade vivida dentro desta clínica, realidade esta que, diante do sofrimento físico e psíquico de pacientes, familiares e equipe cuidadora, vem aos poucos pedindo e valorizando a importância do profissional de psicologia na equipe de saúde. 

No contato com as práticas e intervenções desenvolvidas diretamente para atender a demanda dos pacientes onco-hematológicos, as reflexões e questionamentos sobre as intervenções mais adequadas no contexto de vida destes pacientes no momento de doença são constantes. Indaga-se sobre o que os psicólogos, especialistas na área da saúde podem, dentro do contexto da doença hematológica, oferecer para este ser humano que sofre física e emocionalmente.

No contato com pacientes, familiares e equipe de saúde dentro do setor de onco-hematologia, esta pesquisa bibliográfica foi pensada e desenvolvida com objetivo de identificar, em algumas das principais bases de dados, trabalhos publicados que descrevem atividades (intervenções) de profissionais da psicologia dentro do contexto da onco-hematologia e da oncologia. Foram coletados quinze trabalhos, de diferentes autores, instituições, e com diversos objetivos e referenciais teóricos, possibilitando-nos um panorama mais claro sobre o que tem sido realizado dentro desta especialidade. 

O presente trabalho tem caráter descritivo, pois localiza e descreve as intervenções realizadas nesta área, que foram publicadas nas bases de dados pesquisadas. A partir dos dados obtidos, os autores buscaram discutir sobre tais intervenções, trazendo à pesquisa um caráter também reflexivo. Sabe-se da existência de inúmeras intervenções e serviços que, em função da não publicação de seus trabalhos, não foram aqui incluídos, impossibilitando-nos de enriquecer o trabalho com suas experiências.

A ONCO-HEMATOLOGIA
Segundo Alberts (1997), o câncer é formado por células mutantes que adquirem autonomia de crescimento e multiplicação, interrompendo o seu processo de amadurecimento normal. Um tumor será maligno quando suas células tiverem a capacidade de migrar para tecidos vizinhos causando tumores secundários. As neoplasias malignas são divididas entre os tumores sólidos e as neoplasias hematológicas, sendo que o último é tratado pela especialidade da hematologia, mais precisamente a onco-hematologia.


No grupo das doenças oncológicas, onde segundo Ferrari e Herzberg (1997) se encontram as neoplasias hematológicas, estão as leucemias agudas e crônicas, os linfomas e o mieloma múltiplo, dentre outros. Geralmente estas doenças não estão restritas a uma única região do corpo, mas se manifestam em várias áreas do organismo sem respeitar barreiras anatômicas. 

O sangue, a medula óssea e os gânglios linfáticos, além do baço e do fígado, são órgãos mais freqüentemente envolvidos neste processo. A onco-hematologia é terreno de grande complexidade, e tem sido objeto de estudo e dedicação de diferentes profissionais da área da saúde. Segundo dados da Fundação Oncocentro (2005), dos tumores apresentados em mulheres, 3,8% são do sistema hematopoético (responsável pela produção do sangue), sendo que nos homens, este número aumenta para 4,6%.
As leucemias são divididas em agudas e crônicas. O grupo das leucemias agudas é dividido em mieloblástica e linfocítica, sendo que essa diferenciação é feita na célula de origem de cada grupo. De forma geral as leucemias agudas apresentam uma evolução muito rápida, sendo necessário o diagnóstico precoce e o tratamento rápido. Apesar de ser um tipo raro de câncer, a leucemia aguda apresenta um elevado índice de morte em pessoas abaixo da idade de 35 anos. A incidência das leucemias é semelhante por todo o mundo, sendo que, dentre as leucemias agudas, a mieloblástica tem ligeira predominância sobre a linfocítica. São mais predominantes nos homens, sendo maior o número de casos nos de raça branca. A idade de acometimento difere enormemente entre dois grupos, sendo a leucemia linfocítica aguda (LLA) muito comum até os 10 anos de idade e a leucemia mielóide aguda (LMA) muito comum na média de 65 anos de idade.

O tratamento entre os dois grupos também é muito diferente. Além disso, a leucemia mielóide aguda tem um pior prognóstico que a crônica. As leucemias crônicas também apresentam a forma mielóide e linfocítica. A leucemia linfocítica crônica (LLC) é a mais comum das leucemias. Apesar de todos os avanços nos conhecimentos sobre a doença e na forma de tratamento, atualmente mais avançadas, não houve nenhuma mudança na sobrevida destes pacientes. A leucemia linfocítica crônica apresenta-se habitualmente no paciente com idade acima de 60 anos, motivo pelo qual muitas vezes o tratamento quimioterápico agressivo não é utilizado, atingindo-se assim índices de cura próximos de zero. Outro motivo que leva o tratamento a ser feito de forma paliativa é a característica da doença que, muitas vezes, não requer uma intervenção terapêutica, vivendo o paciente por volta de 20 anos sem maiores problemas. (Sociedade Brasileira de Cancerologia, 2005)
Ainda segundo a Sociedade Brasileira de Cancerologia (2005), os linfomas caracterizam-se pela proliferação anormal das células do tecido linfóide. As doenças de Hodgkin e não-Hodgkin apresentam algumas características clínicas semelhantes, mas divergem na célula de origem, forma de apresentação, tratamento e nos resultados do tratamento. Estão entre as doenças malignas que melhor respondem ao tratamento com radioterapia e quimioterapia. 

O índice de cura da doença de Hodgkin é em torno de 75% para os pacientes com o tratamento inicial e nos casos de recidiva; já os linfomas não-Hodgkin são curados em menos de 25% dos casos. O número de casos de linfoma não-Hodgkin é aproximadamente cinco vezes maior que o de doença de Hodgkin. Essas duas doenças apresentam um acometimento muito grande de pacientes em idade produtiva (adultos jovens).

Segundo ABRALE (2005), o Mieloma Múltiplo é um câncer da medula óssea, onde há o crescimento descontrolado de células plasmáticas. Embora seja mais comum em pacientes idosos, há cada vez mais jovens contraindo a doença.

Sobre o tratamento do câncer, Yamaguchi (1994) explica que ele pode ser curativo, almejando a eliminação da doença; de suporte, buscando um controle da doença; ou paliativo, visando apenas a diminuição da dor e do sofrimento do paciente. Estes tratamentos abrangem cirurgias, quimioterapias, radioterapias, transplantes de medula óssea (TMO), dentre outros; podem ser empregados isoladamente ou em conjunto, dependendo de cada caso. No caso da onco-hematologia, a quimioterapia, a radioterapia e o TMO são as medidas terapêuticas mais presentes de acordo com a realidade clínica destes pacientes.

A quimioterapia, segundo Ferrari e Herzberg (1997), é um tipo de tratamento baseado na administração de substâncias químicas, que atuam nas células do câncer, principalmente durante sua divisão. A ação destas substâncias se estende por todo o corpo, com exceção do Sistema Nervoso Central. O principal efeito colateral da quimioterapia é a queda de produção de células do sangue (mielodepressão), ocasionando indisposição física e suscetibilidade a infecções, sangramentos, inflamação do trato digestivo (mucosites), além de náuseas, vômitos e queda do cabelo (alopécia). 

Ainda segundo Ferrari e Herzberg (1997), a Radioterapia, baseada na ação de radiação para o tratamento do câncer, pode ser administrada externamente ou pela colocação da fonte de radiação em seu interior e apresenta ações locais, buscando a destruição das células cancerosas por meio da interferência na estrutura de seu DNA. Normalmente os efeitos colaterais deste tratamento são restritos às áreas irradiadas.

O Transplante de Medula Óssea (TMO), procedimento de grande complexidade médica, traz consigo grande impacto na vida dos pacientes. Tal procedimento tem sido utilizado para tratar uma série de doenças hematológicas, dentre algumas outras, que eram consideradas incuráveis no passado. Ferrari e Herzberg (1997) explicam que o TMO é um tipo de tratamento baseado na administração de altas doses de quimioterápicos (associados ou não à radioterapia), que visam destruir a medula óssea que em seguida será substituída por uma nova medula que é infundida no paciente. Existem alguns tipos de transplante; são eles o Alogênico, o Autólogo ou Autogênico e o Singênico. 

O primeiro é realizado pela doação de uma medula óssea compatível que é implantada no paciente; no segundo a própria medula do paciente é colhida, tratada e infundida novamente; e o terceiro é o transplante entre irmãos gêmeos idênticos. Estes procedimentos são extremamente complexos e invasivos e suas decisões dependem de diversos fatores como a idade, estágio da doença, condições físicas, doador compatível dentre outras. As decisões não dependem somente do próprio paciente e de sua condição física e emocional, mas também da existência ou não de um doador e de sua disponibilidade para este processo.
Dadas as intensas demandas físicas e emocionais - indução do regime, imunossupressão, isolamento físico e social, hospitalização prolongada - associadas ao procedimento de TMO, bem como o seu crescente uso, enquanto modalidade terapêutica para uma variedade de doenças malignas e hematológicas, a qualidade de vida (QV) de pacientes submetidos ao TMO tem emergido como uma área crítica de estudo. (Almeida & Loureiro, 2000)
Tal procedimento cria uma nova perspectiva de vida, porém traz consigo muitas dificuldades, resultantes de efeitos colaterais, do risco do tratamento e do sofrimento emocional advindo de uma angústia muito grande vivida nas diferentes etapas deste processo. 

Segundo Andrrykowski (apud Almeida e Loureiro, 2000), embora o TMO seja uma terapia para salvar vidas, o procedimento por si só está associado com um risco significativo de mortalidade. Os pacientes podem escolher continuar com o tratamento convencional, mas sem perspectiva de cura, ou optam pelo TMO que traz mais risco, mas também maior potencial de cura. 

Segundo Almeida, Loureira e Voltarelli (1998), pesquisas recentes têm registrado uma diversidade de efeitos psicossociais do TMO, incluindo disfunção sexual, dificuldades nas relações sociais e relacionamento interpessoal, ansiedade, depressão, baixa auto-estima, dificuldade de re-inserção profissional, limitação quanto às atividades recreativas, dificultando, assim, o processo de adaptação do paciente.

A PSICO-ONCOLOGIA
Seja pela gravidade da doença ou do tratamento, se trabalha em um contexto onde o índice de óbitos é alto, tornando de grande importância um serviço que forneça respaldo psicológico para o paciente, seus familiares e equipe profissional. Sabe-se que dentro deste contexto, diversos trabalhos têm sido desenvolvidos com a intenção de oferecer atendimento psicológico. 

Com a descoberta da doença, que acontece na maioria das vezes de forma brusca, o paciente passa por situações diversas. A doença, tratamento e conseqüências adjacentes interferem em diferentes questões e transformam a vida dos pacientes, que não é mais “dono” sozinho de sua rotina, mas está submetido às necessidades do tratamento e da rotina do serviço hospitalar.

Chiattone (1998) coloca que no contexto da doença, além dos efeitos físicos presentes pelo quadro médico, o diagnóstico atinge diretamente a integridade psicológica dos pacientes, tornando-os fragilizados e vulneráveis. Esta situação é geradora de extrema angústia, em geral por dor, culpa, temor à separação dos familiares (em função do isolamento), sofrimento e a eminência da morte, desencadeando reações psíquicas específicas que variam de acordo com os recursos psicológicos internos de cada paciente. 

Tanto as próprias questões físicas, inerentes as doença e ao tratamento, quanto as questões psíquicas, adjacentes a este quadro, favorecem o surgimento de angústias, questionamentos, reflexões, sofrimentos e até mesmo o surgimento de um quadro com sintomas psicopatológicos que exijam a intervenção psiquiátrica. É exatamente neste terreno, de delicadas sensações, onde se encontra o paciente, normalmente bastante fragilizado em função do diagnóstico, prognóstico ou mesmo em conseqüência de seus tratamentos penosos. 

A inquietude perante a evolução da doença, a esperança em relação aos tratamentos e à cura, os exames médicos, os momentos de espera face ao que é desconhecido, a hospitalização, os efeitos colaterais, a qualidade de vida, dentre outras diversas questões, faz o dia-dia destes pacientes.
A intervenção psicológica em uma Unidade de Transplante de Medula Óssea, se adequadamente estruturada, apresenta-se como um recurso que amplia os limites de ação da equipe médica no atendimento das necessidades que surgem em cada momento da trajetória do paciente oncológico: iniciando-se no diagnóstico, percorrendo o tratamento e podendo alcançar as situações posteriores de adaptação do paciente às seqüelas concretas ou subjetivas com que se deparam (Veit et al., 1998).
Para uma reflexão sobre as possibilidades de intervenções psicológicas, é necessária a contextualização das situações vividas pelos pacientes. Kovács (1992) escreveu sobre o homem diante da morte, entendendo que desde o momento do diagnóstico, o paciente passa por diversas etapas, onde pode reagir de diferentes maneiras, de acordo com sua estrutura emocional. No caso de doenças graves, como o câncer, a pessoa tem os planos da própria vida interrompidos, trazendo à tona angústias muito intensas em relação à eminência da morte.

Segundo Carvalho (1997), desde o filósofo Hipócrates há o entendimento de que o que acontecia na mente afetava o corpo. Com o advento da tecnologia baseada no modelo cartesiano de pensamento, foi desenvolvido o modelo dicotômico que influenciou diretamente a ciência, dentre elas a medicina, entendendo a partir daí que para se conhecer o todo, deveria estudar as suas partes. Neste momento perde-se a visão integral do ser humano, dividindo a mente e o corpo, como entidades distintas.
Já no fim do século passado, em que era clara a influência cartesiana na medicina, Freud, em seusEstudos sobre a Histeria propôs um retorno a uma visão mais integrada do ser. Freud demonstrou que as paralisias histéricas eram destituídas de um substrato neurológico, não restando dúvidas de que seus trabalhos apontavam na direção de uma visão mais integrada do homem, mostrando que acontecimentos da esfera psíquica causavam conseqüências orgânicas. (Carvalho, 1997)
Ainda segundo Carvalho (1997), Franz Alexander, em Chicago, Estados Unidos, criou a medicina psicossomática que assumiu novamente o papel de que a mente tem relação com a saúde física. Alexander fazia relações entre aspectos psicológicos e interações psiconeuroimunológicas. Foi a partir da década de 50 que os trabalhos de orientação psicanalítica começaram a surgir, estudando a relação entre a estrutura de personalidade e o desenvolvimento do câncer. Hoje a medicina não se detém a encontrar causas únicas para as patologias, ela busca, de forma mais abrangente, olhar o ser humano como um ser bio-psico-social.
O achado de uma causa não nos exime da tarefa de investigar no terreno dos significados inconscientes, do mesmo modo que o achado de um motivo psicologicamente compreensível não nos exime da investigação das causas eficientes através das quais o transtorno se realiza como uma transformação da configuração dos órgãos e suas funções. Em lugar de serem incompatíveis, ambas as interpretações da enfermidade podem ser contempladas como as duas faces de uma mesma moeda. (Chiozza, apud Carvalho, 1997)
A psicologia tem desenvolvido trabalhos nesta área expandindo seu campo de atuação. A psico-oncologia, segundo Gimenes (apud Ferreira, 2002), é uma interface entre a Psicologia e a Oncologia, constituindo um campo de intervenção. Esta especialidade que se desenvolveu dentro da área da saúde busca, dentro de um contexto interdisciplinar, criar serviços de assistências e pesquisas e suas estratégias de intervenção podem ser utilizadas em diferentes níveis, desde a fase da prevenção até o tratamento, as reabilitações ou na fase terminal da doença. 

Segundo Costa Junior (2001), a psico-oncologia deve ser entendida por nós como um instrumento que viabiliza atividades interdisciplinares no campo da saúde, desde a pesquisa científica básica até os programas de intervenção clínica. Esta especialidade começou a ser sistematizada a partir da percepção de que fatores não orgânicos influenciavam no surgimento, evolução e no resultado do tratamento do câncer. Em função dos avanços da medicina e da descoberta de novos medicamentos houve um aumento do tempo de vida destes pacientes, ampliando a necessidade de acompanhamento psicológico nas diferentes fases da doença.

As intervenções psicológicas, sejam elas dentro do contexto da saúde ou não, são pautadas em referenciais teóricos que norteiam e direcionam as práticas de seus profissionais. A psicologia é uma área bastante ampla e abrangente, e sua prática é baseada fundamentalmente em seu referencial teórico, que com suas particularidades, desenvolve sua prática embasada em sua teoria. 

As principais abordagens teóricas que encontramos são a psicanalítica, comportamental, fenomenológica, analítica (Junguiana), sistêmica, dentre outras. Nestas abordagens, de forma geral são atendidos: pacientes, familiares, equipe e, em alguns casos, a comunidade. As modalidades de atendimento normalmente são individuais e grupais e a metodologia pode ser analítica, psicoterápica, de apoio ou informativa (orientação).


OS ARTIGOS DA PESQUISA
Diante desta vasta possibilidade de atuação, a presente pesquisa levantou as práticas da psicologia dentro da onco-hematologia nas seguintes bases de dados: Dedalus (USP), Psiqué (SBP-SP), LUMEN (PUC-SP), LILACS - Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências da Saúde e MEDLINE. O período da pesquisa foi entre o ano de 1995 até 2005, sendo priorizados materiais da onco-hematologia em detrimento aos artigos da oncologia. 

Foram também priorizados os materiais de trabalhos realizados em território nacional, buscando um panorama brasileiro dos trabalhos na área, também como os materiais mais recentes. Foram inseridos na pesquisa 15 trabalhos seguindo as prioridades acima descritas. Como a inclusão dos trabalhos se restringe às intervenções da psicologia na área da onco-hematologia, os trabalhos teóricos, que somam grande quantidade, foram utilizados para embasamento da presente pesquisa. Tais trabalhos contribuíram de forma bastante significativa, mas têm objetivo diverso dos trabalhos que descrevem práticas e intervenções.

Acreditamos que o levantamento dos trabalhos realizados na área poderá oferecer maior propriedade sobre o assunto, sobre o que tem se feito e publicado, e sobre os alcances e limitações destas práticas, buscando uma reflexão sobre o que é possível ser realizado, dentro da demanda destes pacientes; entendendo que desta maneira estaremos contribuindo para melhores intervenções, projetos e questionamentos dentro do campo da onco-hematologia.

RESULTADOS
Após a seleção dos artigos, para que se pudesse obter um panorama das intervenções psicológicas realizadas e publicadas neste setor, o material foi dividido em algumas categorias, possibilitando uma melhor leitura de seus dados. Esta seleção de artigos, baseada em alguns critérios estabelecidos, não esgota de maneira nenhuma o tema abordado.

Não foram todos os artigos que continham claramente em suas exposições tais categorias, portanto, em alguns casos, estas classificações ocorreram de acordo com a leitura e compreensão dos autores. Sabe-se da existência de trabalhos que aqui não foram incluídos, ou porque não constavam nestas bases, ou porque se referiam a discussões teóricas sobre o tema, que acabaram contribuindo apenas para as discussões e reflexões.

Dentre os artigos pesquisados, 53% dizem respeito a intervenções psicológicas dentro da oncologia e 47% na onco-hematologia. Os trabalhos de onco-hematologia foram priorizados, pois dizem respeito diretamente ao trabalho em questão.

Apesar de todos os trabalhos terem a intenção de comunicar sobre uma intervenção psicológica, cada trabalho tem a intenção de comunicar um tipo específico de informação. Assim como temos trabalhos puramente teóricos, que falam de formulações teóricas desenvolvidas pelos autores, nesta pesquisa foram selecionados apenas trabalhos que descrevessem práticas e intervenções. Dos trabalhos analisados, 47% descrevem uma intervenção e citam a forma de funcionamento do serviço onde este trabalho pôde ser desenvolvido; 33% descrevem apenas uma modalidade de intervenção, sem explicar ou citar o serviço ou local onde esta intervenção foi realizada; e apenas 20% dos trabalhos tiveram o objetivo de descrever um serviço, sua estrutura e intervenções nele realizadas.

Dentre as intervenções, 35% focaram seu trabalho no desenvolvimento de atividades com pacientes e familiares, não deixando o trabalho restrito aos pacientes; 27% somente com pacientes, 20% publicaram sobre intervenções com familiares, 13% citam intervenção com pacientes, familiares e equipe e 5% dos trabalhos falam de intervenções somente com a equipe cuidadora.

Em relação à faixa etária, 60% das intervenções tiveram seu foco no trabalho com adultos, 33% no trabalho com crianças e apenas 7% falam de trabalhos realizados tanto com adultos quanto com crianças.

Quanto à modalidade de atendimento, 60% foram realizados individualmente, 27% dos trabalhos propõem atendimentos individuais e grupais e 13% apenas grupal.

Dos trabalhos pesquisados, 39% não especificam o referencial teórico adotado para fundamentar tal intervenção, 27% se baseiam na psicanálise como referencial teórico, 13% fazem uso da terapia comportamental/cognitiva, 7% terapia sistêmica, 7% analítica (Junguiana) e 7% usam a fenomenologia como referencial para seu trabalho.

Assim como o referencial teórico adotado tem suas variações, os tipos de intervenções também: 40% das intervenções têm finalidade psicoterápica, 13% de orientação, 7% análise, 7% terapia de apoio, 7% grupo operativo, 13% tem finalidade tanto psicoterápica quanto de terapia de apoio e 13% tanto psicoterápica quanto de apoio e de orientação.

DISCUSSÃO


Primeiramente encontramos nos resultados um panorama sobre o que se tem publicado de psicologia dentro da onco-hematologia. Os resultados informam o leitor sobre as intervenções da psicologia que foram publicadas, isto é, que de alguma forma foram indexadas a alguma base de dados e divulgadas para o meio científico. Porém, estes dados também são representativos quando se tem a intenção de saber quais as intervenções que têm sido desenvolvidas pelos profissionais da psicologia dentro da onco-hematologia. Podemos, a partir destes pontos, observar alguns dados e especular algumas questões. Indiretamente encontramos também um panorama sobre as intervenções realizadas pela psicologia dentro destas especialidades. 

Sabe-se que muitos serviços não possuem publicações sobre seu trabalho e tal aspecto, de certo modo, limita a pesquisa, que acaba falando diretamente somente sobre o que se tem publicado em onco-hematologia. Mas entende-se também, que a publicação científica diz muito das práticas e de suas metodologias, oferecendo-nos indiretamente informações sobre tais procedimentos.
De acordo com o recorte utilizado neste trabalho, foram priorizados os trabalhos de onco-hematologia. 

Somente após a coleta destes materiais foram incluídos trabalhos referentes à oncologia, buscando complementar o trabalho com experiências muitas vezes bastante próximas da realidade da clínica onco-hematológica. Desta forma, não temos um panorama comparativo entre publicações em onco-hematologia e oncologia, mas sim, artigos e intervenções que se somam dentro de um contexto da psico-oncologia como um todo. Como citado anteriormente, a oncologia é uma especialidade bastante abrangente e já possui muitos trabalhos e serviços de psicologia dentro de sua clínica. Na onco-hematologia, em função do significativo número de portadores de neoplasias hematológicas, muita dedicação, estudos e trabalhos estão em desenvolvimento neste setor, fazendo-se compreender o percentual significativo de intervenções realizadas dentro desta realidade.
No que se refere aos temas mais abordados pelos profissionais e pesquisadores que atuam em psico-oncologia podemos citar os seguintes em ordem decrescente: atendimento psicológico a crianças com câncer (17,8% dos trabalhos), atendimentos psicológicos a pacientes com câncer de mama (15,6% dos trabalhos), atendimento psicológico em contexto de terminalidade e morte (14,4%), desenvolvimento de atividades por equipes multidisciplinares de saúde (11%), preparação e atendimento psicológico a pacientes cirúrgicos (8,5%), atendimento ao familiar do paciente com câncer (6,5%), preocupações com a formação de profissionais de Psicologia para atuação em psico-oncologia (4,9%) e outros menos freqüentes e estatisticamente não significativos nesta distribuição. (Costa Junior, 2001)
Costa Junior (2001) nos fornece alguns dados sobre o tema dos trabalhos realizados em psico-oncologia, porém o autor fez sua coleta de dados em congressos de psico-oncologia, diferindo desta pesquisa, que buscou nas bases de dados seus materiais. Durante a coleta de dados, foram encontrados muitos trabalhos cujos temas se referiam às práticas em onco-hematologia ou oncologia, mas que somente estavam disponíveis em forma de “resumo de congresso”, ou “resumo de evento”, não constando em forma de artigo, impossibilitando sua consulta.

Sobre o objetivo dos trabalhos (Figura 2) dos artigos pesquisados, todos tiveram a intenção de expor sobre uma intervenção; esta foi, inclusive, a condição para que estes artigos fizessem parte desta pesquisa. Além deste objetivo em comum, cada qual possui objetivos específicos, sendo que 47% falam com mais detalhes de uma modalidade de intervenção e somente citam a forma de funcionamento do serviço onde tal intervenção foi realizada. 

Apenas 20% dos trabalhos encontrados nos oferecem uma visão geral, mais ampla e abrangente do serviço de psicologia estruturado dentro da oncologia, possibilitando-nos conhecer desde sua estruturação até sua forma de atuação. Costa Junior (2001) se refere ao perfil de trabalhos em congressos de psico-oncologia, e cita que:
Quanto ao tipo de trabalho desenvolvido, pouco mais de 60% se referiam a relatos de experiência, em que o(s) autor(s) descrevia(m), de modo mais genérico ou não, sua experiência(s) profissional(is) junto a um ou mais serviços de atendimento a pacientes de oncologia. Observa-se que nem sempre as informações contidas eram suficientes para permitir ao leitor compreender os objetivos e/ou procedimentos de trabalho utilizado(s) pelo(s) autor(s). Poucos trabalhos continham informações que indicassem preocupação do(s) autor(es) com procedimentos sistemáticos de intervenção profissional, critérios eletivos quanto a que procedimento utilizar e em que situação ou preocupações com medidas de eficácia ou efeitos da intervenção profissional executada. (Costa Junior, 2001)
Dos artigos coletados nesta pesquisa, apenas alguns fornecem de forma detalhada uma descrição de seus serviços; dentre eles o artigo publicado por Costa Junior e Coutinho (1998), oferece uma ampla descrição do Programa de Atendimento Psicológico da Unidade de Onco-Hematologia Pediátrica do Hospital de Apoio de Brasília. O artigo descreve as atividades desenvolvidas por profissionais e psicólogos dentro deste serviço e a assistência oferecida para pacientes pela equipe de saúde que o integra, explicando as parcerias firmadas entre o hospital e a graduação de psicologia. 

Neme (1999), em sua tese de doutorado, descreve também um serviço de psicologia na oncologia criado pela autora no Hospital Manoel de Abreu na cidade de Bauru. A autora explica o serviço e sua estruturação, descrevendo sua intervenção pautada na psicoterapia breve, na terapia de apoio e de esclarecimento. 

Desenvolve uma pesquisa buscando compreender as possíveis relações entre as condições psicológicas gerais e os modos e direções de esforços de enfrentamento apresentados pelos pacientes estudados e seus familiares; buscou também compreender os efeitos do tratamento psicológico no processo de lidar com a enfermidade, além de verificar os ganhos terapêuticos obtidos com a psicoterapia breve utilizada por eles no serviço. O último artigo encontrado com este objetivo descreve também a estruturação de um serviço e foi realizado por Torrano-Massetti, Oliveira e Santos (2000), descrevendo o Serviço de Atendimento psicológico na unidade de transplante de medula óssea do HCFMRP-USP, que inclui atendimento para pacientes e familiares, tanto no pré quanto no pós TMO, apresentando as principais atividades desenvolvidas e a avaliação da efetividade de tais trabalhos.

Em relação à faixa-etária, os dados demonstram que o número de publicações de intervenções com adultos ainda é maior do que com crianças. Segundo a Fundação Oncocentro de São Paulo (2002), o câncer infantil ainda é raro, embora observemos um aumento progressivo das taxas de incidência, sobretudo para a Leucemia Linfóide Aguda, os Linfomas Não-Hodgking, tumores no Sistema Nervoso Central, tumor de Wilms e outros tumores renais. 

Algumas estatísticas apontam que uma em cada 600 crianças poderá desenvolver um câncer até os 15 anos. Dos artigos selecionados nesta pesquisa, apenas no artigo “atendimento psicológico numa unidade de transplante de medula óssea” de Torrano-Massetti et al. (2000) que foram encontradas intervenções tanto com adultos quanto com crianças.

Das publicações incluídas nesta pesquisa, a maioria dos trabalhos relata intervenções tanto com pacientes quanto com familiares, deixando clara a importância do atendimento se estender também ao familiar. Este trabalho mais abrangente é essencial dentro da oncologia, e aos poucos, os trabalhos vão também incluindo a equipe de saúde em suas intervenções.


O atendimento individual ainda é muito maior quando comparado ao grupal. 60% dos atendimentos são individuais e apenas 27% propõe atendimentos individuais e grupais (Figura 5). O atendimento individual ainda é o mais utilizado dentro da psicologia, apesar do crescente desenvolvimento de atividades grupais.
Dentre as diversas modalidades de psicoterapias, é imprescindível incluir aquela que tem uma dimensão grupalística, a qual, comprovadamente tem se mostrado eficaz e de grande abrangência, porém que, em nosso meio brasileiro, ainda não encontrou um campo de aplicação clínico mais sistemático e consistente. (Zimerman, 1999)
 Zimerman (1999) acrescenta que aos poucos os trabalhos grupais vêm abrindo espaço de valorização e aplicação, tendo objetivos diversos de acordo com a finalidade que eles desejam alcançar. As principais modalidades grupais são os grupos operativos e os psicoterápicos.

Segundo Costa Junior, (2001), nos últimos congressos de Psico-oncologia há um crescente aumento da participação de outras metodologias, como os atendimentos de grupo a pacientes e familiares, programas de recreação e de desenvolvimento de habilidades de enfrentamento, acompanhamentos domiciliares, grupos de auto-ajuda, dentre outros, que indicam uma tendência de expansão metodológica da área conforme as demandas vêm sendo identificadas pelos profissionais.

Quanto à finalidade da intervenção psicológica, a psicoterapia é a mais utilizada. Podemos observar isto na Figura 7, onde 40% das intervenções têm finalidade psicoterápica. A “psicoterapia é um termo genérico que costuma ser empregado para designar qualquer tratamento realizado com métodos e propósitos psicológicos.” (Zimerman, 1999). 

O autor ainda esclarece que muitas vezes o termo “psicoterapia” engloba uma série de possibilidades, psicanalíticas ou não, baseadas em sua concepção teórica e em suas aplicações práticas. Isto significa que dentro de diferentes referenciais teóricos o termo psicoterapia é utilizado para designar práticas diversas, podendo ocasionar certa confusão quanto ao seu significado.
Assim, senso lato, psicoterapia pode designar desde uma situação de simples “aconselhamento”, uma “orientação” diretiva e sugestiva, uma “ab-reação”, um “reasseguramento”, ou alguma das diversas formas de “psicoterapia de apoio”, assim como também é possível que esteja aludindo a uma “terapia cognitiva”, ou “comportamental”, ou ainda “psicodramática”, “transicional”, “sistêmica” (para casal, família), “grupal”, etc,etc. (Zimerman, 1999)
A psicoterapia psicanalítica, referencial teórico que embasa o trabalho dos autores desta pesquisa, como o próprio nome já refere, é baseada nos fundamentos psicanalíticos. A terapia de apoio, bastante encontrada nos resultados desta pesquisa, pode, como todas as outras técnicas utilizadas, possuir um caráter bastante pessoal, baseado na orientação teórica que a fundamenta; segundo Zimerman (1999), ela pode ser compreendida como uma simples prestação de consolo ou de conforto, porém, quando se trata da terapia de apoio de base psicanalítica, Zimerman explica que há um caráter bastante forte, buscando discriminar e localizar a parte sadia e forte do paciente, reforçando os mecanismos mais desenvolvidos do ego e propiciando melhores condições de enfrentamento de determinadas situações. 

A orientação, modalidade bastante comum nos hospitais, fornece ao paciente e seus familiares orientações e esclarecimentos de caráter mais prático e objetivo; temas relacionados à doença, ao tratamento, à internação, aos efeitos colaterais etc são abordados e podem ser orientados pela equipe multiprofissional.

Apenas a minoria dos trabalhos encontrados cita intervenções isoladas de análise, terapia de apoio e grupo operativo.
Em relação ao referencial teórico dos trabalhos desta pesquisa, chama a atenção o fato de que a maioria dos trabalhos não especifica em seu texto o referencial teórico utilizado para embasar tal atuação. Cada profissional possui embasamentos teóricos bastante específicos e, a partir destes conceitos, desenvolve as práticas que entende por mais adequadas para aquele contexto. Porém, não se deve esquecer que, independentemente do referencial adotado, estes trabalhos buscam sempre uma melhor adaptação do paciente à sua condição atual de doença; 27% dos artigos pesquisados se baseiam na psicanálise como referencial teórico, 13% fazem uso da terapia comportamental/cognitiva, 7% terapia sistêmica, 7% analítica (Junguiana) e 7% usam a fenomenologia como referencial para seu trabalho.

CONCLUSÕES
Diante desta pesquisa, dos dados obtidos e da reflexão realizada a partir deste material, alguns pontos obtêm mais destaque e evidência. O trabalho dentro da onco-hematologia é complexo e, em muitos momentos, insalubre. O contato do profissional de psicologia com pacientes que vivem em um contexto demasiadamente penoso é, ao mesmo tempo, árduo e instigante. 

O desenvolvimento da presente pesquisa se deu a partir do questionamento constante sobre “O que poderemos fornecer aos pacientes neste momento de suas vidas?”, “De que tipo de trabalho se beneficiariam? Que modalidade de intervenção? Pautada em quê?”.


São escassos os trabalhos que permitem conhecer melhor os serviços criados, suas estruturas, seus funcionamentos, quanto menos ainda suas dificuldades. Este dado parece deixar uma espécie de alerta para que os profissionais se dediquem mais a tornar suas experiências públicas, entendendo que desta maneira estarão contribuindo muito para a experiência de outros colegas e para o avanço da ciência.

Trabalhar tão próximo da morte remete o profissional a muitas questões; questionamentos existenciais, conflitos particulares e sentimentos de impotência são muito presentes no dia-a-dia deste trabalho. Mesmo assim, são poucos os trabalhos que expõem os percalços deste caminho, trazendo muitas vezes uma sensação de distância e impessoalidade em relação aos artigos publicados.

Fica evidente, a partir dos dados obtidos, que intervenções dos mais diversos tipos têm sido desenvolvidas dentro de diferentes serviços. Percebe-se que tais intervenções variam de acordo com o referencial teórico do profissional que está à frente da criação e desenvolvimento dos serviços. 

Trabalhos realizados por profissionais com referencial comportamental, por exemplo, mostram um caráter mais objetivo, se utilizando de técnicas e procedimentos que buscam a obtenção de um determinado resultado, ao passo que trabalhos baseados na teoria analítica (junguiana) se interessam e priorizam muito mais o material simbólico trazido pelos pacientes, não estabelecendo focos tão específicos para suas intervenções. Desta maneira, cada serviço acaba tendo um caráter muito próprio, e desenvolvendo suas atividades baseadas na compreensão daqueles profissionais sobre o ser humano.

Dentro do Serviço de Psicologia da Clínica de Hematologia do HCFM-USP existe espaço para indagações e questionamentos a respeito destas práticas. O serviço vem se estruturando há algum tempo, contando hoje com a possibilidade de algumas modalidades de atendimento a pacientes, familiares e equipe de saúde. 

O referencial teórico utilizado é o psicanalítico, e a partir dele, autores como Donald Winnicott, entre outros, embasam as intervenções psicológicas realizadas neste setor. Segundo Freud (apud Zimerman, 1999) a psicanálise é um processo de investigação, um método de tratamento e uma disciplina científica.
Já há algum tempo a psicanálise cria espaços para sua prática dentro de instituições e tem fornecido subsídios teóricos e práticos para a sustentação de seu trabalho.
Psicanálise pode ser um instrumento fundamental para assistir uma pessoa próxima da morte (...). A tarefa é acompanhar o paciente na busca de sua verdade, quando possível. Ao lidarmos com pacientes terminais, lidamos com questões essenciais da existência humana de um modo muito vívido, o que nos traz a necessidade de mantermos um estado de mente aberta, permitindo que os sentimentos dos pacientes nos penetrem, mas prestando atenção para não sermos levados a uma situação contra-transferencial que pode invadir o paciente. Ao invés disso, nossos sentimentos podem ser usados para a compreensão do estado de mente do paciente. O setting psicanalítico é antes de mais nada um setting interno. (Montagna, 1991)
São inesgotáveis as questões relativas ao trabalho do psicanalista, porém vem se tornando clara sua função dentro de um contexto como o da onco-hematologia. Este profissional, inserido na equipe, tem a intenção de oferecer-se como escuta e continente, para que juntos, paciente e terapeuta ou psicólogo e profissional possam elaborar os efeitos da nova e impactante realidade.
A questão que se coloca é a de tornar possível o encontro com o outro, este desconhecido. A capacidade de empatizar, através das atuais práticas em Psicologia da Saúde, tem sido o caminho humano facilitador de fugazes encontros, possibilitando o compartilhar de experiências difíceis dentro do ambiente hospitalar, e assim, conseguindo insights valiosos acerca da capacidade humana de comunicar-se. Esta capacidade fica aqui traduzida como a tentativa de fornecer ao paciente uma sustentação emocional para a vivência de experiências relacionadas ao tratamento. (Barros, 1999)
De acordo com Volich (2000), terapeuta em grego significa “eu cuido” e na Grécia antiga, terapeuta antes de tudo era aquele que se colocava junto àquele que sofria, que compartilhava da doença do paciente buscando compreendê-la. Um terapeuta é alguém que responde a um pedido de ajuda em relação a um sofrimento; o paciente busca alguém com quem possa compartilhar e que se disponha a acolher este pedido. Deseja falar muitas vezes de um “sofrimento que o próprio sujeito desconhece, mas que encontra no sintoma, na queixa, sua forma de expressão mais requintada, quase sempre, a única possível naquele instante de sua vida.”(Volich, 2000)
Psicoterapia não é fazer interpretações argutas e apropriadas, em geral, trata-se de desenvolver, a longo prazo, aquilo que o paciente traz. Esta é a forma pela qual me apraz pensar em meu trabalho, tendo em mente que, se o fizer, suficientemente bem, o paciente será capaz de descobrir seu próprio Eu (Self) e será capaz de existir e sentir-se real. (Winnicott, 1975)
Tal trabalho necessita de muito estudo, muita dedicação e disponibilidade interna. Somente pesquisas e trocas de experiências entre profissionais podem contribuir e enriquecer tais práticas, somando esforços para oferecer a estes pacientes atendimentos sensíveis, adequados e coerentes com seu momento de vida. “Nossa função como psicanalistas é necessária onde haja a necessidade de alguém para pensar os pensamentos que ainda não foram pensados, este podendo talvez ser o caso da maioria das pessoas, vivendo ou morrendo.” (Montagna, 1991).


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O PACIENTE DE AIDS NO CONTEXTO DA AJUDA PSICOLÓGICA.

1. Sobre o tema e suas direções
Este relatório é produto de um ano de trabalho em instituições de pacientes de AIDS. A pergunta sobre as possibilidades e limitações do psicólogo no atendimento com pacientes de AIDS, nasceu durante o curso de antropologia ministrado pela professora Carla, durante o 3o. período. Foi feita uma entrevista com um paciente soropositivo, que era militante do GAPA-MG.
Este paciente é um homossexual que na época tinha 40anos, era divorciado de uma mulher com quem tivera uma filha, de 19 anos. Contraíra a doença em saunas gays, na década de 80, logo após assumir para a esposa sua condição. Separaram-se e ele manteve vários relacionamentos homossexuais. 


As propagandas divulgando a doença e esclarecendo sobre o comportamento de risco, fez este paciente pensar que poderia estar contaminado. Procurou um médico e fez o exame. Após o resultado positivo, procurou vários outros profissionais, buscando falsear o resultado, inutilmente. Entra em depressão e é aposentado pela empresa multinacional, onde ocupava um cargo de confiança. Diz que havia desistido de viver, mas não tinha forças nem para se matar. Procura um analista, elabora suas questões e dois anos após o resultado de seu exame, funda o grupo Viver e o Gapa-MG. Militante das questões que envolvem homossexualismo e AIDS, este paciente 
encontrou no trabalho de ajuda a outros doentes e soropositivos, um motivo para recomeçar sua vida.

"Quem vocês acham que vai morrer primeiro, eu ou você? Eu tenho AIDS, mas você pode sair daqui e ser atropelada por um caminhão. Faz alguma diferença?" Esta pergunta que ele me dirigiu durante a entrevista, foi fundamental para o direcionamento da minha vida acadêmica e do meu processo de análise. Iniciei algum tempo depois uma pesquisa pelo CNPq sobre o atendimento a pacientes de AIDS. Busquei no estudo da teoria psicanalítica bases teóricas para meus questionamentos: Quais as possibilidades de análise de um paciente de AIDS? Como fazer a inserção desta escuta no hospital, ambiente tão peculiar para o atendimento individual e de urgência?

 

Durante 360 dias, incluindo fins de semana entrevistei profissionais, participei de grupos e conduzi  em estágio de práxis psicanalítica e na área hospitalar, a análise de pacientes de AIDS em diferentes estágios. Tal trabalho me obrigou a uma teorização sustentada por um exaustivo levantamento bibliográfico. 

Acho imprescindível uma revisão teórica, para introduzir logo após, as possibilidades de um atendimento psicológico. Como o trabalho proposto na clínica de AIDS foi interrompido prematuramente, tentarei não dar um ar de trabalho terminado, pois o trabalho em hospital é interminável e precisa sempre ser revisto e teorizado. Não é possível escolher um caso isolado, todos foram singulares e especiais. Mas sem dúvida a clínica de AIDS é e será sempre um trabalho muito recompensador, apesar de angústias e dúvidas sempre revividas. Nos grupos, encontrei homossexuais em conflito, mulheres revoltadas com uma bissexualidade dos maridos ou amantes e crianças  assustadas pelo preconceito social de que eram vítimas e nem ao menos sabiam o porquê.

Vários pacientes morreram no CTI do hospital das Clínicas ou do Eduardo de Menezes durante o trabalho. Outros recusaram o atendimento, e preferiram viver e elaborar a angústia a seu modo. Outros  preferiram passar esta fase difícil em companhia de quem amavam, mas muitos abriram o caminho para um estudo e acolhimento profissional especializado. Sem dúvida a questão do atendimento psicológico ainda paira no ar: qual a melhor abordagem para um trabalho psicológico com pacientes de AIDS? Como realizar uma psicanálise em uma situação tão urgente? Quais as formas possíveis: Individual ou atendimento em grupo? Como trabalhar com crianças? 

Eu optei pelo trabalho de psicanálise, pensando em uma clínica da pulsão. Mas este trabalho me deu a oportunidade de realizar um estudo sobre os métodos possíveis, e que não devem ser desprezados, mas escutados e se não nos sentirmos capazes de abordar o paciente em tal teoria, saber que nem todos os pacientes precisam escolher a nossa abordagem e há outras que podem acolher e ajudar. Afinal o compromisso ético do psicólogo é com seu cliente, um compromisso de responsabilidade e respeito com tudo que vem do ser humano.


2. Histórico

A AIDS surgiu nos USA, no final da década de 70, embora não se saiba ao certo como iniciou. Várias hipóteses foram inventadas; uma diz que seria uma criação de laboratório, para experimentos que levariam a uma guerra bacteriológica, mas a teoria mais aceita é que seria uma virose originária de macacos africanos que se disseminou entre os seres humanos daquele continente, para depois ser propagada para a América Central e então para a América do Norte por Homossexuais e drogaditos.

Os CDC (Centers for Disease Control) que são órgãos do governo Americano, foram os primeiros a noticiar casos do que viria a ser a epidemia de AIDS, no jornal Morbility and Mortality Weekly Report, em 05 de Julho de 1981. Esta primeira notícia referia-se à incidência de casos graves de uma pneumonia rara, causada porPneumocystis carinii, que tinha acometido jovens homossexuais em Los Angeles. Um mês depois, este mesmo jornal noticiou que 26 homossexuais masculinos jovens, residentes em Nova York e na Califórnia, apresentavam Sarcoma de Kaposi e infecções oportunistas, comuns em homens idosos e com características étnicas específicas como os judeus. Foi percebido que os doentes apresentavam mesmos comportamentos sexuais e de uso de drogas.

A partir de então, esta misteriosa doença que se caracterizou inicialmente por atingir homossexuais masculinos, ficou conhecida como câncer-gay e passou a ser manchete nos jornais do mundo inteiro. Em 1983 Luc Montagner, na França e Robert Gallo nos USA, isolaram o vírus que inicialmente recebeu nomes diferentes, para posteriormente serem unificados como Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV).
    
O nome Síndrome de Imunodeficiência Humana foi escolhido, por ser a AIDS, uma doença que não tem uma manifestação única, mas sim, por se caracterizar pela aparição de várias doenças sucessivas e/ou simultâneas, que podem ter uma ou várias causas comuns.
    
Esta Síndrome, afeta o sistema imunológico - sistema responsável pelo combate a "agentes nocivos" que invadem o organismo humano, tornando-o deficiente. Nos pacientes com AIDS, o sistema imunológico funciona precariamente e o organismo vê-se exposto a uma multiplicidade de agentes infecciosos, muitos dos quais habitualmente inofensivos, mas que, nessas condições, conseguem atingir um alto índice de nocividade, pois a doença causa uma baixa completa nas defesas orgânicas.
    
Como o agente infeccioso penetra no organismo através de um contágio feito pelo sangue e esperma que chegam até o sangue do receptor, diz-se que é uma Síndrome adquirida.
O agente causador da AIDS é um retrovírus (HIV), contendo ácido ribonucleico (RNA). Este vírus  infecta as células linfáticas e neurais, sendo por isso denominado, linfotrópico e neurotrópico. Nestas células, ele se reproduz, causando a morte celular. O vírus infecta os linfócitos T4, o que leva a uma diminuição do número de macrófagos, as células killers, que matam os agentes invasores, linfócitos  assassinos e linfócitos B. Com a função imunológica comprometida, aparecem as infecções oportunistas e neoplasmas específicos, nas pessoas com HIV. Várias síndromes mentais orgânicas podem surgir do comprometimento do sistema nervoso central por HIV, assim como pode haver prejuízos no SNC por infecções oportunistas e neoplasmas cerebrais.
    
No Brasil, os primeiros casos que hoje são considerados como AIDS ocorreram em 1981, antes do teste existir. Hoje, a incidência de casos se ampliou para outros setores da sociedade, podendo atingir a qualquer um: não se restringindo à classe social, raça ou preferência sexual.


3. Morte: dos gregos à AIDS
    
Durante muito tempo, a morte foi considerada um fato corriqueiro, um acontecimento familiar, o qual as pessoas, inclusive as crianças pressentiam o momento, presenciando e se comportando receptivamente à idéia. As pessoas desempenhavam papeis que lhe eram esperados: recebendo a morte de forma afetuosa.
    
Os egípcios tinham um livro dos mortos, onde ensinavam as pessoas a se familiarizarem com a morte, que se tornava um acontecimento desejável e familiar, necessário após o cumprimento do ciclo da vida. Foi no século XI, que a idéia da morte começou a ser modificada. Este momento, que começava a se desenvolver o pensamento individualista, possibilitou que o pensamento cristão tivesse influência. Para os cristãos, as pessoas dormiam e no momento do juízo final, acordariam, ou melhor, "ressuscitariam", para o paraíso e aqueles que não fossem cristãos, os pecadores, receberiam o fogo do inferno, onde queimariam por toda eternidade.

 
    
Esse pensamento, começou a mudar no século XV, com a crença que no momento da própria morte, o indivíduo, cristão ou não, teria uma oportunidade para se arrepender de seus pecados. Tal pensamento torna a salvação dependente do próprio indivíduo, que podia assim, viver fora dos valores religiosos e no momento da morte harmonizar-se com a religião. Até o século XVIII, o indivíduo  fazia um testamento, onde  incluía  condições para a salvação de sua alma. Estas condições, que deviam ser realizadas, perde seu sentido após este século, quando o ritual passa a consistir no culto às sepulturas, desenvolvendo o sentimento de afetividade familiar.
    
Parece que foi com o aumento dessa afetividade que a idéia de morte tornou-se mais difícil, na cultura ocidental. A família deixa de compartilhar a consciência de morte do indivíduo e, antes pelo contrário, passa a negá-la e a evitá-la. É nesse contexto que a morte em casa passa a ser evitada, passando os familiares a desejar a morte no hospital, a evitar longos velórios e enterros, preferindo a cremação dos corpos.
    
Enquanto na Antigüidade, a renovação das gerações, possibilitada pela reprodução sexuada, era vista como forma de evolução, hoje em dia, estamos acostumados a lidar com a vida como se a morte não existisse, pelo menos não para nós mesmos. Freud em "Nossa atitude diante da morte", diz: " No fundo ninguém crê em sua própria  morte" e mais adiante, "no ICS cada um de nós está convencido de sua própria imortalidade.
    
É nesse momento atual, onde a sociedade se vê em dificuldades para aceitar a morte que surgiu a AIDS, trazendo à tona, de modo compulsório questões e tabus que até então eram resguardadas para o sujeito. AIDS e morte tem uma relação estreita. Percebe-se nos atendimentos a pacientes soropositivos que estes relacionam seu futuro com a morte, de forma culpada e preocupados com seu tempo de vida.
    
Quase todos os pacientes que foram observados, sabiam que seus comportamentos, poderiam levá-los a ter AIDS, ou seja, sabiam que eram responsáveis pela contaminação. O conhecimento de ser um agente ativo, parece fazê-los se sentir responsáveis por sua própria morte, que a eles parece ser prematura.
Retomando as atitudes de se expor às formas de contaminação, penso que elas podem ser entendidas, à luz da teoria psicanalítica, fazendo uma análise do que o sujeito tem de mais primitivo, as pulsões.


4. Pulsão e AIDS

Pensava-se que os números de contaminações diminuiria com o aumento da informação sobre AIDS, mas temos percebido que tal perspectiva não tem se concretizado. As pessoas relatam estar bem informadas sobre as formas de contaminação, mas mesmo assim, relatam correrem riscos, sabendo que correm tal risco, mostrando de modo evidente e até cruel que os comportamentos do sujeito podem ser expressão tanto de vida quanto de morte. Freud, em 1920, escreveu "Alem do princípio do prazer", considerando que o sujeito tenha sempre prazer, ou seja, que os eventos mentais são regulados pelo princípio do prazer. Mas como este prazer tende a contrariar outras forças internas, a harmonia nem sempre acontece favorável ao prazer, resultando muitas vezes em sofrimento do sujeito.
    
No mesmo texto Freud diz, que o princípio do prazer é um mecanismo de funcionamento do aparelho psíquico, que visando a auto-preservação do organismo, mostra-se muitas vezes ineficaz, podendo até colocar o sujeito em risco. Mais adiante, Freud considera existir dois tipos de processos, contraditórios e que coexistem no sujeito, operando um de forma construtiva e outro de forma destrutiva. Diz Freud: "... descrevemos a oposição não entre instintos do ego e instintos sexuais, mas entre instintos de vida e instintos de morte", completando mais na frente que "o princípio do prazer, parece na realidade, servir aos instintos de morte." 
    
Nos pacientes de AIDS, parece que podemos observar comportamentos que nos permitem deduzir, que são regidos pelo princípio do prazer, pois parecem buscar o sofrimento para si e em alguns casos, causar sofrimentos. Retomando Freud, que conclui que os atos regidos pelo princípio do prazer podem ser regidos tanto pela pulsão de vida quanto pela pulsão de morte, responsável pela repetição compulsória de atos que causam dor e sofrimento. Nas situações que o processo primário parece não conseguir se transformar em processo secundário, a pulsão de morte parece se sobrepor à pulsão de vida.
    
A pulsão de vida e de morte, parecem se misturar a todo instante, assim um ato pode estar servindo a uma ou outra pulsão.O ato sexual, por exemplo, pode estar vinculado a pulsão de vida, mas é a morte das pessoas já existentes,  que dá condições para que as novas espécies sobrevivam. Podemos então pensar com Freud, que "a morte é antes uma questão de conveniência, uma manifestação de adaptação às condições externas da vida". Ainda no "Além... ", Freud considera que o aparelho psíquico, substitui o processo primário, que está regido pelo princípio do prazer, sob a dualidade pulsional, em processo secundário, ou seja regido pelo principio de realidade. Com isso, queremos dizer que o aparelho psíquico visa proteger o sujeito, transformando a manifestação da pulsão de morte em manifestação da pulsão de vida, ou seja, possibilitando que o prazer seja alcançado, porém em concordância com o princípio de realidade.



    
Podemos então, tentar explicar a contaminação e a recontaminação do sujeito HIV+, bem como o comportamento de transmitir o vírus, a outras pessoas, à luz da teoria das pulsões. "Em pulsões e suas vicissitudes", Freud diz que uma pulsão pode se manifestar de diversas formas, passando por diversas vicissitudes. Uma das formas, que nos interessa é a reversão ao seu oposto: "A reversão de um instinto ao seu oposto transforma-se, mediante um exame mais detido, em dois processos diferentes: uma mudança da atividade para a passividade e uma reversão de seu conteúdo.
    
Um par estudado por Freud que nos interessa, é o par sadismo - masoquismo. Enquanto para ele o sadismo é um mecanismo de defesa da libido narcísica contra a pulsão de morte, o masoquismo é o fracasso desse mecanismo. Assim, os pacientes que se contaminam e os que se recontaminam, estão dirigindo a pulsão de morte contra o ego: masoquismo, enquanto os pacientes que buscam contaminar aos outros estão dirigindo a pulsão de morte para o exterior, buscando a proteção do ego, é o sadismo.
    
Agora, acho ser possível analisar a questão da responsabilidade dos pacientes em sua contaminação, pois para a psicanálise, o sujeito não é inocente, frente à ação determinada pelo saber inconsciente.
Há um complexo conjunto de determinações que direcionam o sujeito para determinadas relações e ações que se repetem. É a pulsão de morte a responsável pela repetição, portanto é o sujeito responsável (na maioria das vezes) por sua contaminação. Mas a responsabilidade não  se refere ao ato, mas sim ao caráter: o homem se sente responsável pelo seu ser, o que significa admitir que a ação tem uma condição subjetiva, o caráter, e o sujeito percebe que não é inocente nisso que sofre, pois é inevitável que um ato seu preceda todo o processo de contaminação, e neste instante, que o sujeito deve perceber que não é um pobre coitado, marcado por um destino miserável e uma vida cheia de tocaias. Neste momento, em que o sujeito se dá conta de que está implicado neste ato, uma presença que escute isto que o sujeito tem a dizer, se torna possível, e segundo a teoria psicanalítica, a presença do psicólogo se faz necessária.


5. Aids e grupo de risco: uma questão social.




Uma revisão na história, nos permite verificar que a sexualidade humana está vinculada à moral e a história da igreja, que desde seu surgimento, passou a dizer o que era permitido praticar e o que era pecado e deveria ser evitado. Para difundir suas idéias e obter resultados, começaram a disseminar sentimentos de culpa.
    
Durante a Inquisição, prostitutas e mulheres virgens, porém belas, foram condenadas à fogueira, por suspeitas de manterem relações sexuais com o diabo. Como conseqüência, a reforma religiosa levou a uma volta à moral antiga, dando a igreja amplos poderes sobre a sexualidade do indivíduo que precisava da sua permissão para se casar.
    
Mas é, segundo Foucault (1984), no século XVII, século que marca o desenvolvimento do pensamento capitalista, que a repressão sexual é intensificada, embora se encontrem registros de haver mais liberdade que no século XIX. O século XVII marca também que a prática sexual era regulada pelo poder e  falar de sexo era considerado subversão da moral e dos bons costumes, ditado pelos capitalistas burgueses. A ação da igreja incentivou o controle, e a repressão foi mantida, encerrando a sexualidade dentro de casa, um privilégio dos casais que praticavam a única forma de sexo aceitável.
    
Qualquer outra prática sexual, deveria ser negada, escondida, ficando a relação dentro do casamento restrita aos atos regulares e aceitos: as carícias, abstinência e fertilidade passam a ser normatizadas, numa escala de certo e errado. Nos dois séculos seguintes, as práticas reprimidas foram repensadas, desviando a atenção do casamento para a sexualidade desviante, dos loucos e das crianças. 
    
O homossexualismo nesta época é visto como conseqüência de perversões e desvios sexuais. Mas é no século XX, que alguns tabus são discutidos, as repressões são menores e muitos comportamentos passam a ser aceitos. As relações extraconjugais, bem como as pré- matrimoniais e entre pessoas do mesmo sexo, passam a ser toleradas, de forma implícita. Certos comportamentos ainda considerados desviantes são recriminados socialmente, buscando a sociedade, respaldo científico para as práticas legais. Atos considerados anteriormente, pela medicina, como desviantes são considerados como distúrbios em critérios diagnósticos recentes, como o DSM-III.
    
Atualmente, vemos que a exploração da sexualidade é tida como formas de propaganda positiva. Muitas empresas associam seus produtos como forma de obter prazer, o que atesta que o controle da igreja já não mais interessa aos capitalistas, por trazer prejuízos, não mais lucros.
    
A AIDS marca a história do século, sendo descrita e caracterizada medicamente, num momento de transição histórica, que, acreditávamos que as enfermidades infecciosas e, sobretudo, as ameaças de epidemias, já não constituíam um problema para as sociedades modernas. Ao trazer à tona tabus e estigmas sociais tais como o sexo, a sexualidade, a droga, o preconceito e a violência, a AIDS nos remete a situações passadas,  em que doenças graves ligadas à sexualidade foram motivos de discriminação e de culpabilização dos doentes. Torna-se necessário qualificar, particularizar e dimensionar a situação da AIDS nesse contexto de morbidade.
    
Essa doença que surgiu como categoria diagnóstica marcada por questões como a homossexualidade, o que pode ser mais evidenciado por uma das primeiras denominações propostas,  Gay related Immune deficiency9 passa a ser uma doença causada por um ‘mau comportamento' "e as pessoas que sempre cumpriram um destino de impureza atribuída do ponto de vista de nossa tradição patriarcal, que tinham a Síndrome de Inferioridade Adquirida (AIDS/SIDA e que sempre existiu), passam a ter um vírus para identificá-las, que as tornam ‘cientificamente' perigosas"8 . A sexualidade dita homossexual passou a ser abertamente considerada como uma sexualidade sem freios, completamente promíscua. Da mesma forma, a possibilidade de existência de doentes heterossexuais foi descartada, num primeiro momento e, transcorrido 15 anos, ainda com base na mesma vinculação, os discursos remetem paradoxalmente a uma crença na justiça do mundo, apontada com soberana convicção pelos mecanismos de defesa: a AIDS acontece com os outros e não comigo.
    
As outras situações de risco para a AIDS têm um ponto em comum com a prática homossexual: envolvem a introdução do vírus no organismo humano circunstâncias que dependem direta ou indiretamente de ação consciente do ser humano: relações heterossexuais, injeção de drogas, transfusão, transmissão placentária. Assim criam-se as vítimas culpadas, responsáveis pelo seu padecimento merecido, que se contrapõem às vítimas inocentes do mesmo mal. A AIDS, desta forma pode ser classificada naquele grupo de doenças que dependem do comportamento e podem por ele ser modificadas. Assim a AIDS não é socialmente comparada com outras doenças, facilitando que um problema da Saúde Publica se confundisse com questões morais.
    
Em muitas entrevistas, foi comum verificar que a AIDS é uma doença maldita, que marca o paciente como transgressor da moral e regras sociais, levando-o a se sentir culpado. Para a sociedade, nada mais justo do que se sentir culpado, "do doente de AIDS ninguém tem pena", diz um paciente.
    
Na verdade, percebe-se que a AIDS, provocou grandes traumas na sociedade. Houve alterações profundas nas relações do portador com sua família, grupo social e profissional. Parece que no nível Social, a AIDS está sendo comparada à peste negra; os pacientes carregam um estigma que apesar de não ter amparo legal, pode ser reconhecido nos discursos correntes.
    
Nelson Solano, em um artigo, coloca a importância de que a sociedade se organize para exigir do governo benefícios sociais, programas de informação e prevenção às doenças. Este autor faz uma revisão na história e conclui que tudo que se conseguiu junto ao governo, foi fruto do trabalho de organizações e movimentos de resistências que exigiam a tomada de providências com relação aos segmentos sociais prejudicados. O autor enfatiza a importância da participação social criando e exigindo do Governo medidas de contenção e tratamento da doença com relação à AIDS.
    
Nesta sociedade desorganizada, em relação à Síndrome, surgiram as organizações não-governamentais, as ONGs, criadas para cobrar junto ao governo e autoridades legais, as medidas necessárias em relação ao tratamento e prevenção da doença, bem como proteger, dar apoio e solidariedade ao paciente. 
Podemos concluir que o paciente de AIDS, provoca raiva, desprezo, medo e pouco desejo de ajuda por parte da sociedade, o que acarreta nele, sentimentos de ansiedade, o que dificulta as possibilidades de intervenções sociais e psicológicas.


6. Aids e saúde pública
    
A ciência tem progredido muito desde o século XVIII, principalmente no que diz respeito à ciência médica. A descoberta dos antibióticos, levou a uma crença de que as doenças infecciosas e as epidemias, já não constituíam ameaças para a humanidade, cujo comportamento deixa de ser "fantasiosamente" desvinculado dos riscos de morrer ou adoecer, pois acreditava-se poder recorrer sempre a medicina, que possuía uma terapia infalível para torna-lo saudável.
    
Assim, muitas doenças ainda matam, mas na maioria dos casos, a ameaça não é concretizada por inexistência de tratamento, mas por falta de acesso aos serviços de saúde, visto que os avanços da medicina, não foram acompanhados pela melhoria dos níveis de vida e saúde da população. Hoje, a alguns anos do século XXI, os problemas principais da saúde não foram resolvidos, nem mesmo nos países mais industrializados.
    
O surgimento da AIDS como epidemia, trouxe novos problemas à saúde publica. Foi necessário rever os poderes e limites da medicina, que há muito não se defrontava com uma doença que ameaçasse toda a humanidade. Esforços não tem sido medidos para encontrar a cura da AIDS. Quinze anos já se passaram desde o primeiro caso registrado e um extenso caminho foi percorrido, com pesquisadores do mundo inteiro tentando contribuir para a cura.
    
As formas terapêuticas existentes para combater as doenças acometidas pelos pacientes tem sido utilizadas, mas ainda não há cura para a doença: a medicina retarda um fim que todos sabem ser inevitável.
Nos pacientes com AIDS, penso ser possível verificar o processo da doença como um problema social, no qual as origens e desenvolvimentos de determinadas patologias, dependem dos grupos sociais. A analise da doença a partir do nível social, reformula, sem excluir os outros níveis, demonstrando que os processos sociais determinam a saúde coletiva.
    
Como a AIDS é uma epidemia que coloca em risco a saúde coletiva, tornou-se então, um problema moral e agudo para qualquer administração da saúde publica. Os caminhos percorridos pela ciência na procura da cura,. bem como as campanhas de prevenção precisam ser analisadas sob a luz da saúde publica.
    
Num primeiro momento há indicações que a saúde publica pretende enquadrar os profissionais da área em padrões exigidos pela organização de uma produção cada vez maior. No entanto, qualquer programa a ser implementado na rede publica exige reflexão mais profunda e elaborada, que com o encerramento prematuro do trabalho, infelizmente não foi possível realizar.


7. Aids e medicina


A AIDS pode ser comparada às epidemias do passado sobretudo no que diz respeito ao empenho da ciência médica e no terror social.
    
"Doença em que a morte e a vida se acham tão estranhamente fundidas que a morte toma o bulho e a cor da vida, e a vida toma a forma sombria e a terrível da morte; doença que a medicina nunca curou, que a saúde nunca repeliu". Desta forma, Susan Sontag (1984) compara a AIDS a doenças como a lepra, doença maldita, intimamente relacionada à morte. O leproso representava o perigo, a solidão, era digno da piedade dada aos mortos. Parece ser com esses sentimentos que o HIV + convive. Como se tivesse comprado uma passagem só de ida para uma viagem sem retorno ao mundo dos mortos.
    
Esta comparação social não encontra similaridades clínicas, pois a AIDS evolui de modo distinto à hanseníase, embora seja vista como algo que desestrutura o sujeito, colocando em risco sua integridade física e mental. Tais sentimentos geram uma ansiedade que o paciente julga poder ser aliviada mediante respostas e certezas médicas. Mas na AIDS, ainda não temos conclusões definitivas, nem mesmo respostas para todas as perguntas, o que em alguns casos torna difícil a relação médico-paciente.
    
Foi impossível chegar a uma conclusão sobre a relação médico-paciente, visto que das instituições a serem pesquisadas, só duas tiveram os dados colhidos integralmente, o que me impede de modo ético a tomá-los como resultados. Penso, então, ser útil apontar algumas particularidades encontradas na revisão bibliográfica.
    
Os pacientes em geral, parecem classificar a forma como o diagnóstico é feito de forma satisfatória, embora em alguns casos seja possível anotar sérias queixas sobre a relação médica.
    
Numa análise distanciada, talvez realmente se possa classificar o atendimento como se possa classificar o atendimento como "satisfatório", mas, nos chama a atenção, a ausência de conteúdo emocional nas respostas dos pacientes.
    
Os doentes sabem que, neste momento, a medicina não pode fazer muito pelo seu problema, mas em meio à sua angústia, depositam no médico todas as suas esperanças, "acreditando" ser o médico onipotente e capaz de curá-lo. A crença na onipotência médica faz com que o paciente se aproxime do profissional, facilitando um vínculo transferencial.
    
Em alguns casos, o profissional parece ter dificuldade em lidar com a angústia que a questão da morte lhes provoca. Preparados supostamente para a cura, permitir a morte parece muito difícil, mesmo que tal fim seja o melhor para o alívio.
    
Em sua tese de doutorado, Souza (1991) escreve: "Lembro-me de pacientes examinados durante os anos de minha carreira. A muitos não consegui oferecer o afeto por eles esperado. Neguei afeto. Não percebi o que estava acontecendo. Não entendia a linguagem que usavam. Não havia lógica no que diziam. Se os tivesse ouvido de outra forma, teria havido sim, sua outra lógica, outro sentido ..." Minha geração de médicos preocupada prioritariamente com a técnica, esqueceu-se do lado humano, aliás não ensinado adequadamente no curso de medicina. E é preciso adquiri-lo. "Não no sentido da erudição ou da adaptação da tecnologia ou ainda de humanitarismo ou filantropia, mas sim do humano que existe em nós."

 
    
Se em alguns casos, os dados confirmam que o médico na vida real é educado na falsa crença de curas onipotentes, por outro lado, médicos que ao se defrontarem com pacientes gravemente enfermos, se sentem desorientados e investem na compreensão de sua própria mortalidade, encarando a morte de um paciente não como um fracasso pessoal, mas como contingência profissional. Enquanto os primeiros não conversam, mas interrogam, os segundos escutam, trabalhando sua ansiedade manifesta na sua relação com o paciente, procurando respostas possíveis para suas perguntas.
    
O medo a incerteza e as preocupações éticas são alguns dos problemas enfrentados pelos profissionais que quando assumem para si seus limites e poderes, se tornam capazes de sustentar a clínica de AIDS, com suas incertezas, bem como sua posição de ser humano mortal e falível.


8. Estágios Clínicos

A AIDS é uma doença de etiologia viral, provocada por retrovírus que após se instalar no interior dos linfócitos humanos, causam alterações lentas e graves nas células imunológicas, o que torna o doente vulnerável a uma infinidade de patologias, infecções oportunistas e neoplasias.
    
Diferenciamos rigorosamente os termos HIV e AIDS, o que na linguagem ao senso comum são sinônimos. HIV se refere ao vírus da Imunodeficiência humana, enquanto AIDS se refere à síndrome que este vírus provoca.
    
Ao entrar em contato com o vírus, o indivíduo pode se contaminar, passando a ser portador desse vírus, por um tempo que é variável. Após uma infecção inicial, denominada aguda, o portador passa por um tempo variável sem que o problema de saúde relacionado ao vírus. Esta fase de infecção assintomática é muito perigosa, pois não sabendo que está infectado, o portador passa a ser um agente contaminante.
    
Segue a classificação dos Centers for Disease Control (CDC), para os estágios da infecção pelo HIV:
        
1) soroconversão ou infecção aguda
2) infecção assintomática
3) Linfadenopatia generalizada persistente
4)  
a - doença constitucional: perda de peso, febre, diarréia
b - doença neurológica
c - infecções secundárias (incluindo infecções da deficiência da AIDS e outras infecções)
d - canceres secundários, incluindo os da deficiência da AIDS
e - outras condições
    
O CDC define a AIDS como uma doença de diagnóstico confiável de uma deficiência de imunidade celular ocorrendo em indivíduo sem causa evidente de deficiência imunológica ou outra causa de resistência reduzida a esta doença. Este termo reservado para pessoas com no mínimo uma condição clínica potencialmente fatal ligada à imunodepressão causada pelo HIV propriamente dito está compreendido a partir do estágio 4c. São infecções e doenças oportunistas consideradas específicas como indicativas da AIDS: 
        
a) Infecções protozoárias:
            Pneumonia por Pneumocystis carinii.
            Encefalite por Toxoplasma gondii ou infecção disseminada excluindo infecçào congenita.
            Enterite crônica (mais de um mês) por Cryptosporidium.
            Herpes simples mucocutaneo crônico (mais de um mês).
            Infecção histologicamente evidente por citomegalovirus de qualquer órgão, exceto o fígado e os gânglios linfáticos.
            Leucoencefalopatia multifacial progressiva.

b) Infecções fúngicas
:
            Esofagite por Cândida.
            Meningite criptococica ou infecção disseminada.
            Infecção bacteriana disseminada ( e não pulmonar e linfática).
            Sarcoma de Kaposi. 
            Linfoma cerebral primário (limitado ao cérebro).
    
Dentre as doenças mais comuns, envolvendo o sistema gastrointestinal, podemos citar candidiase, afta oral, salmonelose, criptosporiodiose, linfoma, clamidia, gonococus, carcinomacloacogenico.
    
A testagem sorológica - Após a infecção por HIV, os anticorpos ao vírus desenvolvem-se na maioria das pessoas em 6 a 12 semanas, embora a soroconversão possa levar de 6 a 12 meses. Durante este período, os testes não detectam a presença do vírus no organismo, já que os anticorpos não aparecem. Desta forma, pode ser que um sujeito infectado e ainda neste período, obtenha resultados negativos nos testes, embora tenha o vírus e possa transmiti-lo.
    
Os anticorpos produzidos pelo sistema imunológico podem ser detectados por dois testes sericos: o ensaio imunossorvente ligado à enzima (ELISA) e pela imunotintura. O ELISA é usado como o primeiro procedimento de triagem, e um único resultado positivo no ELISA deve ser acompanhado por uma segunda testagem.

O ELISA, não é caro, em si, e pode ser considerado excelente, pois tem sensibilidade de 99,6% e especificidade de 99,2% com os métodos mais aperfeicoados.
    
Após os dois testes ELISA de resultado positivo, é realizada uma imunotintura, para a confirmação final da soroconversão para o HIV. Este teste é o WESTERNBLOT, mais caro que o ELISA, ele confirma ou não o diagnostico inicial.
   
Pode-se viver em média 7 a 10 anos sem sintomas, mas existem portadores assintomáticos do HIV com 15 anos ou mais sem apresentar sintomas. Depois de manifestada a doença, de acordo com os critérios citados acima, pode se viver  em media, 6 anos. Nesta fase a doença já está em estagio avançado e com o auxilio de medicamentos se consegue aumentar a vida do paciente de 6 meses a um ano para cerca de 3 ou 4 anos.
Estão surgindo vários tratamentos que tendem a auxiliar no combate as doenças "oportunistas" e reforçar a imunidade do organismo. Estes procedimentos vêm auxiliando a prolongar a expectativa de vida do paciente, de forma que hoje já se pode falar numa doença tratável, embora não curável, segundo especialistas americanos.
    
O auxilio desses medicamentos, no tratamento, vai alem do auxilio biológico, pois os pacientes demonstram mais esperanças e mais dispostos a continuar lutando, mantendo a vontade de viver. Um tratamento que alivie os sintomas, que torne o organismo mais resistente, aumentando a expectativa de vida do doente, possibilita que este saia da apatia e da depressão.
    
Epidemiologia e transmissão: Estima-se que 1 a 1,5 milhões de americanos, 500 mil europeus e possivelmente 10 milhões de pessoas na África estão infectados por HIV.
     
Após a infecção pelo vírus, o tempo médio para o desenvolvimento da doença é de 8 anos, sendo que o tempo médio de sobrevida é de 18 anos meses, tendo aumentado com o uso de vários tratamentos antivirais.
    
Aproximadamente 82000 casos foram registrados em dezembro de 1988 nos USA e aproximadamente 56% dos pacientes morreram, sendo 62% homossexuais e bissexuais, seguidos dos 27% de drogaditos e mulheres, não usuárias de drogas e heterossexuais, com 4% dos dados.
    
Podem estar infectadas, segundo estimativas, 20 a 25% dos homossexuais e 50 a 65% dos toxicômanos. O HIV está presente no sangue, sêmen, secreções cervicais e vaginais, e em menor grau na saliva, lágrimas, leite materno e liquido cefaloraquidiano. A transmissão do HIV ocorre com maior freqüência através do contato sexual, e de sangue contaminado. As atividades sexuais desprotegidas, são as formas mais comuns de se transmitir o vírus.
As relações homossexuais foram durante algum tempo, o caminho mais comum para se pensar a contaminação; hoje, sabe-se que as relações heterossexuais também transmitem AIDS, e que há casos de mulheres que contaminam os parceiros, o que não se pensava a alguns anos atrás.
    
A contaminação por sangue contaminado ocorre com freqüência quando viciados em drogas intravenosas, compartilham agulhas hipodérmicas, sem técnicas adequadas de esterilização, mas também quando são feitas transfusões sangüíneas, transplantes de órgãos e inseminações artificiais sem testes de sorologia para o vírus.
Também pode ocorrer infecção intra-uterina, sendo a mãe portadora do vírus, e também através do leite materno. Não foram constatadas evidencias de que o HIV possa ser contraído através dos contatos sociais tais como cumprimentar, conversar e tocar pessoas infectadas, embora o contato direto ou indireto com os fluidos corporais já citados, devam ser evitados.


9. Estágios Psicológicos

Nichols (1985), Abrams et al (1986), Ferreira e Abreu (1988) descrevem estágios pelos quais passa o paciente soropositivo semelhantemente aos estágios de pacientes de câncer, descritos por Kubler-Ross (1969) e Marsillac (198 ). Padrões de reações como: dúvida, quando o paciente, sob impacto do diagnóstico, está descrente da realidade e do futuro. A seguir, a negação, caracterizada pela tendência a esquecer ou desconsiderar o diagnóstico. No terceiro estágio, os pacientes, ansiosos e incertos quanto ao desenvolvimento da doença, teme a reação dos outros frente ao diagnóstico, apresentam desamparo, raiva e luto antecipatório. No quarto estágio, os pacientes se preparam para a morte, de acordo com a personalidade de cada um. "5
    
Na fase inicial, se alternam momentos de negação do diagnóstico com intensa ansiedade. Na segunda fase, encontramos sentimentos de culpa, raiva e autopiedade. No estágio seguinte, fase de aceitação, os pacientes aprendem a aceitar limitações impostas pela doença, com mais razão que emoção. A quarta fase caracterizada por uma situação de tristeza é o momento que precede a fase final, na qual o paciente se prepara para a morte.
    
Percebe-se que o medo de ficar totalmente dependente dos outros se sobrepõe ao medo de morrer, chegando muitos pacientes a preferir o suicídio. Os dados obtidos com as entrevistas, indicam que desde o diagnóstico de HIV + até o seu óbito, o paciente passa por distintas vivências psicológicas, exigindo diferentes níveis de atenção. O primeiro momento, ligado à reação frente ao diagnóstico, mostra que o paciente está exposto a uma grande dose de stress e depressão, independentemente de possuir estrutura para suportar a crise, correndo o risco de cometer suicídio outro ato que coloque em risco a si mesmo e aos outros. No contexto psicológico, penso ser necessário uma postura de suporte para que o paciente se organize e elabore a aceitação do diagnóstico e venha a aderir ao tratamento. Após a elaboração do diagnóstico, os pacientes manifestam preocupação com as reações dos outros frente à sua doença com seu comportamento dali para frente. Neste momento surge a necessidade de se informar sobre as formas de transmissão, riscos de vida e detalhes sobre a doença. Dentre os pacientes, os homossexuais e drogaditos, parecem apresentar sentimentos de culpa e auto-censura que precisam ser abordados e explorados, cuidadosamente, pois implicam em comportamentos recriminados socialmente. Os pacientes na fase sintomática - AIDS propriamente dita, necessitam de cuidados diferenciados, pois apresentam deterioração do sistema imunológico, com claras manifestações em doenças que exigem internações constantes e debilitação física, que levam o paciente à sentimentos de pessimismo.
    
Sem poder negar a doença que ele vê agravar diariamente, o paciente parece tentar elaborar as perdas que vão ocorrendo e nesse momento, o profissional deve possibilitar que os sentimentos sejam expressos. Esta abordagem, me parece ser o último nível de atendimento, nos pacientes terminais. Neste estágio, o atendimento deve visar o preparo da família para a morte, assegurando ao paciente que os seus desejos serão satisfeitos e que ele não será abandonado.
    
Para que o psicólogo possa efetuar os atendimentos ao paciente e familiares penso ser necessário que estabeleça vínculo transferencial, que é suporte de um atendimento mais e com perspectivas de ser bem sucedido.


10. Atendimento Psicológico

Por ser uma doença estigmatizada, com peculiaridades que a distinguem de outras doenças graves e letais, como as questões relativas ao sexo e às drogas, o atendimento aos pacientes devem, segundo alguns autores ser particularizado.
    
Nos ambulatórios os pacientes que farão o exame são recebidos pelo serviço de psicologia, enquanto no hospital, o primeiro atendimento é médico. Após a anamnese e os exames de praxe, os pacientes têm acompanhamento psicológico se quiserem. Em caso do paciente estar em hospital geral, o encaminhamento é feito através de interconsulta, dependendo muitas vezes da postura do médico diante dos problemas psicológicos do paciente.
    
Em algumas instituições da saúde publica, a permanência do paciente é a menor possível, pois os leitos são poucos e a demanda é grande, não havendo tempo para um acompanhamento psicológico. Parte destas instituições, os pacientes têm acompanhamento psicológico, e quando tem alta, voltam semanalmente para o atendimento psicológico, que nestes casos, visam permitir aos pacientes lidar com as angustias relacionadas com a doença.
    
A ansiedade nesses pacientes constitui, por si mesma, um dos sintomas mais importantes, seja no memento do diagnóstico como ao longo da evolução da doença. Cada distúrbio corporal ou cada noiva internação são vividos  como um avanço da AIDS e suscitam imediatamente a ansiedade, para após aparecerem outros mecanismos protetores do ego".

 
    
O papel dos profissionais da saúde é importantíssimo, pois muitas coisas podem ser atenuadas e corrigidas pela relação madura e franca entre eles e o enfermo, por isso é necessário uma preparação específica do profissional da saúde, para  que a equipe, possa atuar mais integralmente e com maior satisfação, alargando seus limites e efetuando mudanças na abordagem a pacientes com AIDS, que visem melhorar sua qualidade de vida, para que ele não sofra mais com o pensar sobre a doença do que  com a doença em si. É importante uma visão do tipo de doente internado, quais os objetivos ao lidar com ele e a disponibilidade de tempo para um trabalho tão amplo e individual. É preciso iniciar uma ligação com o paciente, verificar como este poderia viver melhor dentro dos limites impostos pala doença e tratar os sintomas à medida que surgem, tomando-se a coragem necessária à esta ação. O trabalho junto aos doentes objetiva, um tratamento integral, em que se investe na relação com os indivíduos. Busca-se facilitar o entendimento da situação, propiciar melhor evolução clínica, estimular integração social, bem como desenvolver na equipe a capacidade de reconhecer e lidar com as reações emocionais e os desafios. 
    
Autores como Ferreira e Abreu5, que classificam uma seqüência de quatro estágios diante da AIDS, nos quais os pacientes apresentam semelhantemente a pacientes oncológicos, falam que a princípio, os pacientes precisam de um relacionamento com o médico, baseado em franqueza e confiança e de constituição de grupos que incluam familiares, para à seguir, receberem atendimento psicoterápico individual. 
    
Mas o trabalho do psicólogo no hospital, difere do atendimento em consultório, pois implica, segundo certos autores, em dificuldades derivadas do contexto hospitalar: "o atendimento é feito no leito, sem a privacidade desejável, e está sujeito às mais diversas interrupções. Ao contrário das pratica de consultório, no hospital não é o paciente que procura o psicólogo, é o psicólogo que vai ao paciente oferecer seus serviços. Também nem sempre consegue fazer seu trabalho de forma coordenada com o médico que o acompanha e com o pessoal de enfermagem, Enfim, este, deve encarar o fato de que seus serviços não são  a razão de ser da internação do paciente e, via de regra, constitui apenas uma demanda secundaria do paciente. Alem disso, o modelo clinico aprendido na formação acadêmica supõe condições muito diversas daquela que o psicólogo encontra no hospital"4 .
    
E, devido as peculiaridades dos pacientes que apresentam reações emocionais diversas e variadas, entre as quais a depressão e ansiedade e a negação do diagnóstico que, de acordo com pesquisa realizada no hospital Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro2, pode acarretar graves repercussões tanto para o paciente quanto para o meio que o cerca, pois o paciente pode adotar uma atitude de arrogância, desprezo e indiferença com relação à enfermidade e as recomendações medicas, e até mesmo desenvolver quadros psicóticos, já que estes podem ocorrer secundariamente a um comprometimento do sistema nervoso central, o profissional deve estar atento para auxiliar o paciente a se reorganizar diante da grave situação pela qual está passando6 . Para isso, deve centralizar-se no que for mais emergente, possibilitando que o paciente possa reestruturar suas defesas. 
    
Com esses pacientes não dispomos do tempo que dedicamos a outros. Em muitos casos, as soluções têm que ser rápidas, e por isso a postura do profissional deve ser mais ativa. É fundamental que o profissional escute o paciente e permita que ele expresse seus afetos, não esquecendo, porem que seu objetivo é restabelecer sua capacidades interativas. A identificação projetiva é um mecanismo de defesa bastante usado por esses pacientes, o que lhes permite perceber através da reintrojeção se o psicoterapeuta é capaz de suportar os objetos persecutórios de seu mundo interno"3 .
    
O atendimento deve ser feito levando em consideração a história psiquiátrica do paciente, a apresentação  de quadro psicopatologias graves durante o tratamento clínico, pois é de extrema importância os fatos que antecedem a eclosão da doença, em pacientes que estão desenvolvendo a doença, como as reações diante do diagnóstico, relação familiar, doenças anteriores e os aspectos atuais da vida. O paciente deve ser acompanhado em casos de internação e de atendimento ambulatorial.
    
O tratamento medicamentoso, se aliado ao tratamento psicológico, poderá repercutir em uma melhor qualidade de vida dos pacientes infectados, e se o clínico deste paciente, acompanhá-lo durante todo o tratamento, este paciente, terá diminuído o seu sentimento de abandono e solidão. Pacientes que tiveram apoio, segundo alguns profissionais entrevistados, tem uma aderência maior ao tratamento, apresentando menor tempo de internação. MacDonald(1990), afirma que os pacientes portadores do HIV bem assistidos a nível físico e psicológico, dentro de um ambiente estável e integrador, tendem a diminuir o numero de internações.
    
Ainda que muitos neguem a importância de um acompanhamento psicológico na melhoria do quadro clinico do paciente, sua importância de um acompanhamento psicológico na melhoria do quadro clinico do paciente, sua importância não fica diminuída, mostrando-se importante para que o paciente tenha uma completa aderência ao tratamento. Um trabalho a nível psíquico poderá contribuir para que o paciente lide melhor com a doença, os estigmas atribuídos à doença e a ele, enquanto doente, as perdas e  sentimento de culpa, bem como consiga encontrar uma forma mais digna e menos dolorosa de enfrentar a situação.
    
Com tanta responsabilidade e dificuldades, é imprescindível, portanto, um trabalho com outros profissionais que atendem o paciente, particularmente com médico clinico que o acompanha.
    
O medo e preconceito são inerentes ao homem e, em crises como esta, é preciso reavaliar tudo de novo, tentando juntar os conhecimentos adquiridos nas lutas "dos outros"; alguns preconceitos podem já ter sido vencidos por esses outros e não podemos lutar contra a AIDS fazendo de conta que não somos medrosos e preconceituosos.
    
Finalmente, "seria o caso de questionar a necessidade de uma preparação especifica do psicólogo para o trabalho com pacientes com AIDS. Mas não é a AIDS que reivindica um atendimento especial: somos nós que descobrimos, ao encarar a AIDS, mais alguns de nossos limites. E são eles que, conhecendo-os, podemos tentar alargar"3 .

Trabalhando Com Grupos - O trabalho em grupo possibilita que os pacientes possam compartilhar experiências semelhantes, reunir idéias, sentimentos, progressos e vitorias. Permite que os  pacientes participem, se sintam apoiados e integrados.

O momento do atendimento é, muitas vezes , o único momento onde é possível falar da dor, do sofrimento psíquico a que estão sendo submetidos, da dor, da discriminação, do preconceito, da rejeição, do medo da morte, do problema familiar. Outros profissionais, mesmo bem intencionados, não sabem, muitas vezes, lidar com os conteúdos que fazem emergir os medos tanto dos pacientes, quanto dos próprios profissionais, frente a dura realidade que a AIDS nos mostra.

Desta forma, não só o atendimento ao paciente coloca-se como essencial para se propiciar ao sujeito uma melhor adaptação neste momento, como também se faz importante na Preparação da equipe para melhor atender aos casos, lidando também com suas angustias, medos e preconceitos.

Trabalho Em Equipe Interdisciplinar - Os médicos, com freqüência, são vistos como relutantes em compartilhar o cuidado do doente com profissionais de outras áreas. Nos hospitais investigados, uma porcentagem dos dados obtidos parece comprovar tal afirmação, embora outra porcentagem não indique que tal comportamento se mantenha.
    
A maioria dos médicos de doenças infecciosas não colocou quais os obstáculos à participação de outros profissionais. Ao que tudo indica, a AIDS facilitou o trabalho em equipe, pois muitos profissionais parecem necessitar da socialização das dificuldades de tratamento impostas pela doença, com auxílio de outros profissionais. 
    
Penso ser necessário especificar sobre a importância do relacionamento com outros profissionais, do ponto de vista do psicológico. Creio que o psicólogo precisa obter informações sobre a situação física do paciente; informações que no hospital muitas vezes chega ao seu conhecimento antes do primeiro contato com o mesmo. Com o saber de que o atendimento psicológico não é a razão pela qual o paciente se encontra internado, o psicólogo precisa ter para si que é preciso recorrer ao médico, que é quem vai dizer, com sua autoridade de médico, e com forma própria de fazê-lo, qual é a situação real. 
    
Penso ser necessário e importante, o psicólogo atuar em maior relacionamento com o médico, além daquele comum e usual. O entrosamento do psicólogo com o assistente social e terapeuta ocupacional , é também necessário, pois o serviço social permite ao psicólogo o conhecimento das condições familiares e dos grupos em que vive o cliente, permitindo maior conhecimento dos fatores que atuam sobre ele. As atividades da terapia ocupacional constituem parte importante no processo do paciente no hospital, pois permitem descargas emocionais, possibilitando diminuição das tensões, trazendo alívio, pois fazem com que ele se sinta mais seguro, aumentando a sua autovalorização, dando-lhe a sensação de que é útil, de que ele é merecedor de considerações como os demais. Mas o atendimento da terapia ocupacional deve ser trabalhada de forma cuidadosa, pois com o avanço da doença o paciente terá suas capacidades diminuídas e o psicólogo pode prestar e obter informações junto a terapia ocupacional, sobre as condições e possibilidades de trabalho do cliente, que trabalha estará sendo observado em suas realizações práticas.
    
Em sua relação com a fisioterapia, o psicólogo pode se manter a par de cuidados fisioterápicos que poderão resolver muitos problemas de tensão exagerada e necessidade de descargas emocionais.
    
Um trabalho, com a equipe, pode possibilitar aos profissionais, sobretudo aos menos experientes, uma maior adequação de suas condutas, atingindo mais rapidamente o ponto de equilíbrio necessário a uma boa relação com o paciente. Reuniões e discussões em grupo podem levar a uma visão mais global do paciente, do ponto de vista clinico, psíquico e social.
    
As frustrações freqüentes no lidar com uma alta incidência de morte, fazem-se acompanhar de desanimo e sentimentos de impotência, em muitos profissionais, movidos pelo desejo de curar, já que esta doença é até o presente momento incurável. A elaboração do processo, possibilita que o profissional possa ultrapassar esta fase, e passe a perceber que diminuir o sofrimento dos pacientes, permanecer ao seu lado é algo de extrema importância e faz parte desse primeiro processo, enquanto a cura pela vacina ainda não é possível.

Uma discussão com a equipe pode estimular a solidariedade e a coesão grupal, diminuindo a ansiedade e promovendo a saúde mental da própria equipe. Pode também possibilitar o desenvolvimento das potencialidades de cada um e aperfeiçoar a comunicação com relação ao paciente e seus familiares.

É preciso considerar que o profissional também se afeta com os dramas existenciais dos quais participa e em que se envolve. A mobilização de toda equipe diante de determinados quadros, do acaso, de acidentes traumáticos é evidente e coloca todos diante da questão de sua própria morte e daqueles a quem quer bem. Constitui um trabalho difícil, onde há falta de certezas, falta de verdades prontas, de garantias.

Uma médica diz: "... é preciso isolar dentro de si, a emoção da ação medica e tratar o paciente e não o indivíduo, a doença e não o doente como um todo. Para resistir a esse constante desgaste afetivo-emocional e dar uma assistência global ao paciente e sua família é necessário, a participação de uma equipe multi-profissiohal, que realize o atendimento psicoterapêutico.


11. Últimas considerações

Não me sinto à vontade para falar de conclusões, nem mesmo para dizer que os resultados apresentados são resultados finais, visto que o trabalho foi interrompido prematuramente, num momento em que as coletas de dados, estava sendo feita.
    
Há em Belo Horizonte, 5 hospitais da saúde pública e 3 ambulatórios, com serviços especiais de atendimento a pacientes de AIDS, além de 6 instituições não governamentais que prestam serviços ligados à saúde sexual, doenças sexualmente transmissíveis e AIDS . Consta também dados de profissionais da área de saúde, pessoas consideradas na área médica e de saúde mental, que estão realizando trabalhos com doentes de AIDS, sendo que estes trabalhos são responsáveis por melhoras significativas na qualidade de vida destes pacientes, bem como na prevenção e estudos científicos na área de saúde física e mental.
    
Infelizmente, não poderei fazer uma análise destes trabalhos, como foi delimitado no projeto inicial, devido ao seu encerramento antecipado, de modo que por haver coletado dados em menos de 50% das instituições e haver entrevistado também, menos de 50% de profissionais da saúde, que atendem aos pacientes de AIDS em Belo Horizonte, preferi indicar alguns resultados da pesquisa nos tópicos acima, pois não são dados finais e portanto, não me sinto à vontade para vinculá-los aos serviços onde estavam sendo coletados, já que não são garantias de traduzir a realidade de tais instituições. Faço a seguir um breve comentário sobre a importância dos atendimentos psicológicos aos pacientes de AIDS e aos profissionais que os atendem:
    
Os pacientes com AIDS são privados de tratamento apropriado ou forçados a permanecer em hospitais porque não têm casa para voltar devido à discriminação familiar7 , a solidão, aliada ao pânico e à culpabilidade, expressa-se através de afirmações preconceituosas. Há gente sofrendo: ou porque está com AIDS, ou porque vive as conseqüências da maneira de perceber a AIDS que lhe foi instituída. Pânico, repressão, inibições, são algumas expressões que configuram a institucionalização da AIDS. Se a morte inspira medo, mais ainda o faz  o sofrimento inútil do qual pode vir acompanhada - o processo da doença, daí, a função do profissional da saúde não ser só melhorar a qualidade de vida do paciente com AIDS, ele precisa estar apto, também para melhorar a qualidade de morte de seu paciente.
    
Os primeiros contatos com pacientes de AIDS e com uma equipe de saúde em uma das instituições, me mostrou, o quanto lidar com estes pacientes exige um grande desprendimento, capacidade de suportar frustrações e dor, a dor presente no choque entre vida e morte, que se passa diariamente nas reuniões de grupo, e nas corridas de leito.
    
Médicos experientes, ficam perplexos diante dos pacientes, frente ao número, extensão e formas de infecções apresentadas. O temor ao contágio e os preconceitos em relação à enfermidade, presente entre alguns profissionais, está tão presente, que muitos se negam a fazer biópsias, autopsias e todo o tipo de exames. Enquanto no ambulatório os pacientes tem inicialmente contato com a equipe de psicologia que os encaminha e acompanha durante todo o processo de atendimento ambulatorial, o paciente internado, não conta com um atendimento psicológico, a não ser que a equipe de saúde o solicite ou que ele mesmo expresse este desejo, o que devido aos transtornos psicológicos e psiquiátricos, nem sempre é possível.
    
Os membros da equipe de saúde, tem procurado discutir as possíveis dificuldades que talvez dificultem os atendimentos. É uma abordagem desafiadora para os profissionais envolvidos neste trabalho, já que geralmente rompem os limites assistenciais formais, ampliando-se para discussões de problemas que tanto podem pertencer à área institucional, como às dificuldades da relação equipe-paciente.

Na minha opinião, estas reuniões, estão possibilitando que os profissionais, principalmente os menos experientes, consigam adequar sua conduta frente a situações tão difíceis de atingir mais rapidamente, o ponto de equilíbrio necessário a uma boa relação com o paciente.
    
Entre os internos e residentes, as frustrações freqüentes no lidar com uma alta incidência de morte fazem-se acompanhar muitas vezes de desanimo e sentimentos de impotência.
    
O grupo de encontro tem possibilitado a seus membros o desenvolvimento das potencialidades de cada um e o aperfeiçoamento da capacidade de comunicação com os pacientes e embora não tenha pretensão terapêutica, ao estimular a coesão e a solidariedade grupal, na verdade tem diminuído a ansiedade e promovido a saúde mental da própria equipe.
    
Penso que esta equipe está trabalhando para lidar com a coexistência entre Vida e morte que se continuam, numa permanente dialética, como está na dualidade pulsional de Freud. Eles já sabem que há várias formas de morrer, assim como há vários modos de viver e,    "Trabalhar desenvolvendo a consciência de alteridade é também um caminho obrigatório no treinamento de profissionais de saúde e educação ou pesquisadores de AIDS. Trabalhar preconceitos, medos e o respeito à diferença é urgente e garante maior eficácia em qualquer intervenção preventiva que vá alem da simples distribuição de informação. É se aproximar  respeitosamente do outro lado, ser capaz de perceber o outro como parte possível de nós mesmos. É compreender a universalidade de ser humano e ao mesmo tempo sua variabilidade. É tomar contato cuidadoso com nossos próprios lados não vividos, para não se entrar em pânico com alterações do caminho"10 .

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