A poesia não é a própria vida, porém a vida em choque com a vida dos outros. Sua ausência devolvida na ausência próxima. O alheamento é intimidade; a observação, residência.
Sabe disso muito bem a filósofa e psicanalista Viviane Mosé, natural do Espírito Santo e radicada no Rio de Janeiro, que se tornou popular após apresentar o quadro Ser ou não Ser, do Fantástico (Rede Globo), onde explicava assuntos espinhosos da filosofia numa conversa simples e cotidiana. Ela se transfere com domínio para o outro. Realiza um translado lírico de vivência. Um empréstimo de casa, corpo e lugar. Sua
ambição é estar fora de si.
Viviane é uma surpresa, uma voz toda imbuída de curiosidade. Percebe que a força do poema está na suposição. Quando a poesia se torna certeza, impetra-se em religião e dogmatiza, em vez de encantar. Ao imaginar o que os outros podem estar vivendo, expressa uma urgência pessoal. Emociona, cativa, assinala o desejo com voracidade. Na pele da caixa de supermercado ou do vizinho que ama gritando ou da vendedora de doce de leite, sua imaginação está à vontade para completar o que falta conhecer. Não depende de uma escolha entre o que conhece, e sim de sua capacidade fabulosa de elaborar o invisível.
Os dois livros apresentam uma obra em formação, ainda transpirando as influências. Adélia Prado está no tom eminentemente confessional, na percepção aguda do olfato e da atmosfera doméstica. Abordam a cozinha, a espera da pesca e o ritual mínimo do interior, marcas do repertório da autora mineira (lendo Desato I, impossível não lembrar de poemas como Casamento ou Dona Doida). Manoel de Barros marca presença nos versos curtos, explicativos, circulares e redundantes, numa didática da infância. Outra correlação contemporânea é Arnaldo Antunes e a dicção infantil e perguntadeira de Coisas.
Em Desato, Viviane Mosé expande-se em diferenciar os elementos como uma menina. Conceitua o que não precisa ser esclarecido, para readquirir o deslumbramento do momento do aprendizado. Tem o propósito de ser alfabetizada de novo ou alfabetizar de novo. Nela, alternam-se as figuras de professora e aluna, de observadora e observação. Ela quer lavar a palavra, esfregar a palavra nas pedras, livrando-as da poluição do uso corrente, numa proposta semelhante à pré-história das palavras de Barros. Volta à nomeação fundadora do mundo. Explica o que é um bote de uma canoa de um barco de uma jangada. O que muitas vezes irrita pela facilidade e simplificação e, em outras vezes, arrebata pelo espírito frágil e sensível das comparações: “Minha mãe gosta de pescar em rios/ Meu pai sabe pescar em mar.”
Podemos ver uma das entrevistas desta Filósofa, feita pela TV Cultura, no Café Filosófico.
Esta é a primeira parte e aos poucos vamos postar o resto da entrevista e entramos em um debate sobre Educação.
Sabe disso muito bem a filósofa e psicanalista Viviane Mosé, natural do Espírito Santo e radicada no Rio de Janeiro, que se tornou popular após apresentar o quadro Ser ou não Ser, do Fantástico (Rede Globo), onde explicava assuntos espinhosos da filosofia numa conversa simples e cotidiana. Ela se transfere com domínio para o outro. Realiza um translado lírico de vivência. Um empréstimo de casa, corpo e lugar. Sua
ambição é estar fora de si.
Viviane Mosé |
Os dois livros apresentam uma obra em formação, ainda transpirando as influências. Adélia Prado está no tom eminentemente confessional, na percepção aguda do olfato e da atmosfera doméstica. Abordam a cozinha, a espera da pesca e o ritual mínimo do interior, marcas do repertório da autora mineira (lendo Desato I, impossível não lembrar de poemas como Casamento ou Dona Doida). Manoel de Barros marca presença nos versos curtos, explicativos, circulares e redundantes, numa didática da infância. Outra correlação contemporânea é Arnaldo Antunes e a dicção infantil e perguntadeira de Coisas.
Em Desato, Viviane Mosé expande-se em diferenciar os elementos como uma menina. Conceitua o que não precisa ser esclarecido, para readquirir o deslumbramento do momento do aprendizado. Tem o propósito de ser alfabetizada de novo ou alfabetizar de novo. Nela, alternam-se as figuras de professora e aluna, de observadora e observação. Ela quer lavar a palavra, esfregar a palavra nas pedras, livrando-as da poluição do uso corrente, numa proposta semelhante à pré-história das palavras de Barros. Volta à nomeação fundadora do mundo. Explica o que é um bote de uma canoa de um barco de uma jangada. O que muitas vezes irrita pela facilidade e simplificação e, em outras vezes, arrebata pelo espírito frágil e sensível das comparações: “Minha mãe gosta de pescar em rios/ Meu pai sabe pescar em mar.”
Podemos ver uma das entrevistas desta Filósofa, feita pela TV Cultura, no Café Filosófico.
Esta é a primeira parte e aos poucos vamos postar o resto da entrevista e entramos em um debate sobre Educação.
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